Por que Deus escolheu os levitas? Antes de buscar a resposta, esclareço: Levitas eram os descendentes de Levi, terceiro filho de Jacó e Lia. Nessa busca vislumbrei três possíveis respostas. Uma. Foi puramente por sua vontade e soberania. Afinal, como Senhor de tudo e de todos, ele escolhe quem ele quer. Duas. Foi uma homenagem prestada aos ousados levitas, Moisés e Arão, que enfrentaram a corte e os deuses egípcios [Êxodo 5, 12], para libertar o povo hebreu. Três. Foi porque os levitas eram bons de briga [Gênesis 34; Êxodo 32], e ganharam esse privilégio no fio da espada. Fico com essa última.
Vamos aos fatos. O povo estava no sopé do fumegante monte Sinai, e Moisés, lá em cima. Demorando Moisés a descer, aquele povo ficou desvalido, confuso, indefeso e temeroso — como crianças abandonadas no meio do nada —, desesperou-se e resolveu fazer um deusinho para si, que pudesse socorrê-lo em caso de perigo. (Não vemos por aí, em pleno século vinte e um, todo dia, gente muito religiosa, muito evangelizada, mas sem o conhecimento da plena verdade evangélica, se agarrando também a uma imagem, a um crucifixo, a um rosário, a uma medalhinha, a um pé de coelho, a um ramo de arruda, a um pouco de terra do Sinai, ao sal grosso, à água do Jordão, a uma rosa branca ou amarela, ou a um manto, para socorrê-la na hora do perigo?). Pegaram então o ouro das orelhas das mulheres, dos filhos (desde aquele tempo os rapazes já gostavam de usar brinquinho), e das filhas, entregaram a Arão e ele fez um bezerro. No dia seguinte, o povo madrugou para o culto, assentou-se para comer e beber, e se levantou para se divertir — e de tamborins na mão, tocou a dançar. Moisés ficou sabendo e desceu depressa com as duas tábuas do testemunho, ou seja, com os dez mandamentos, que Deus acabara de escrever com o seu dedo. E seu secretário particular, Josué, disse para ele: Há alarido de guerra no arraial. E Moisés replicou: Que nada, é alarido de festa. E quando viu aquele deusinho de ouro, ficou possuído de ira santa e arrojou das mãos as tábuas e quebrou-as ao pé do monte.
Em seguida, vendo Moisés a orgia e a perversão daquele povo, gritou: Quem é do Senhor venha até mim. Então se ajuntaram a ele todos os filhos de Levi. E Moisés concitou-os: Consagrai-vos hoje ao Senhor: cada um contra o seu filho, e contra o seu irmão; para que ele vos conceda hoje uma bênção. Então os levitas mataram do povo naquele dia uns três mil homens, e conseguiram a bênção prometida por Moisés [Êxodo 32]. Que bênção seria essa?
Vamos à escolha. (Agora, já faz mais de um ano que Israel saiu do Egito). Eis que tenho tomado os levitas do meio dos filhos de Israel, em lugar de todo primogênito, que abre a madre, entre os filhos de Israel: e os levitas serão meus [Números 3]. E Deus fez uma permuta com Israel: deu os primogênitos, que ele havia consagrado a si (22.273) [Êxodo 13] em troca dos levitas (22.000). E como havia mais primogênitos do que levitas, os israelitas tiveram que dar o troco em dinheiro. Feitos os cálculos, pagaram 1.365 siclos [Números 3]. Os levitas ganharam essa bênção, mas perderam outra: não receberiam herança na terra de Canaã; a sua herança seria o Senhor [Deuteronômio 18]. Mas em compensação receberiam os dízimos das lavouras e do gado do restante do povo [Números 18]. E como era muito dízimo, podia ser distribuído aos órfãos, às viúvas e até aos estrangeiros, pelos próprios dizimistas, como veremos nos itens seguintes.
Um esclarecimento. Se os levitas não iam receber herança na terra de Canaã, onde morariam?
Bem, seriam destinadas a eles quarenta e oito cidades, das quais 6 seriam cidades de refúgio, para acolhimento do homicida que matasse alguém involuntariamente [Números 34]. As demais tribos teriam que lhes fazer essa doação, proporcional ao número de cidades que tocasse a cada uma delas. Além disso, os arredores dessas cidades, de mil côvados ao redor, seriam para o gado, para os rebanhos e para todos os animais dos levitas. Isso significava que os levitas tinham ao redor de cada cidade uma grande área de terra para o gado, para os rebanhos e para todos os seus animais [Números 35].
Não faz muito tempo, surgiu uma onda, que invadiu os arraiais evangélicos; não tão avassaladora quanto a tsunami, mas que poderia se tornar bastante ameaçadora. Refiro-me à onda dos levitas. Levita pra cá, levita pra lá; e parece que com o apoio de muitos pastores. E eu fiquei na minha, esperando para ver em que isso ia dar. Até uma de minhas filhas chegou a me dizer que era levita. Devia estar levitando! Expliquei-lhe que isso não era possível, e mostrei-lhe na Bíblia, que essa pretensão era inadmissível. Primeiro, porque ela não descendia de Levi. O ofício atribuído aos levitas era exclusivo deles. Segundo, porque, mesmo que ela fosse descendente de Levi, não cabia às mulheres exercerem o ofício atribuído aos levitas. Terceiro, porque na Igreja do Senhor Jesus não existe lugar para o ofício atribuído aos levitas. De fato, no concerto do Sinai, a proposta de Deus era de que Israel seria um reino de sacerdotes [Êxodo 19]. Mas por causa da prevaricação do povo no episódio do bezerro de ouro, enquanto os Levitas ganhavam uma bênção, Israel perdeu a sua, e nunca mais os filhos de Israel chegariam à tenda da congregação. Isso se tornara agora obrigação e privilégio exclusivo dos levitas, e somente para os do sexo masculino [Números 1, 3, 18]. Ora, se os dízimos eram dos levitas... então os levitas é que deveriam receber os dízimos. Logo, logo encontrei alguma coisa na Internet nesse sentido. Havia levitas começando a reivindicar os seus direitos. Ultimamente, parece que a onda se arrefeceu. Não é muito conveniente para o clero essa história de levitas modernos reivindicarem os dízimos. E é bom que se saiba que os levitas não somente serviam no templo como ajudantes dos sacerdotes, e no tempo do rei Salomão, como cantores, mas também serviram como guardas, no reinado de Joás. E não era de brincadeira não. Veja essas instruções que lhes foram dadas pelo sacerdote Joiada: Esta é a obra que haveis de fazer: uma terça parte de vós sacerdotes e levitas, que entrais no sábado, servirá de guardas da porta;... Porém ninguém entre na casa do Senhor, senão os sacerdotes e os levitas que ministram; mas todo o povo guardará o preceito do senhor. Os levitas rodearão o rei, cada um de armas na mão, e qualquer que entrar na casa, seja morto; estareis com o rei quando entrar e quando sair [II Crônicas 23].
Hoje não precisamos mais de levitas. Estão dispensados. O seu ofício cessou. O véu do templo se rasgou de alto a baixo [Mateus 27], e cada crente pode chegar agora com confiança junto ao trono da graça, a fim de receber misericórdia e achar graça para socorro em ocasião oportuna [Hebreus 4], pois somos raça eleita, sacerdócio real, nação santa, povo de propriedade exclusiva de Deus... , como nos assegura o apóstolo Pedro [I Pedro 2].
Ora, se o dízimo foi dado aos levitas, e a Igreja não tem levitas, não há nem mais a quem entregar os 2% que lhes tocariam. Qualquer outra explicação que se dê a isso é balela, arranjo, invencionice. Não tem fundamento bíblico, e, portanto, não tem valor!