DÍZIMO – O engano cavalgando a verdade

Copyright © 2006 Venefredo Barbosa Vilar



Revisão:
Pricilla Pereira Vilar
Samuel Barbosa Vilar
Venefredo Barbosa Vilar


Todos os direitos desta edição reservados ao autor


1ª Edição impressa, julho de 2006, tiragem esgotada!


Edição em CD, maio de 2008


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Prefácio

Antes que você descubra, quero lhe fazer uma honesta, mas triste confissão: Eu não sou escritor. Este livrete é apenas uma atrevida incursão numa aventura literária, e que talvez nem passe de uma simples arenga.

Ocorria sempre que, em conversa com uma ou outra pessoa sobre o dízimo, alguém me sugeria que eu escrevesse a respeito dos resultados a que eu tinha chegado em meus estudos particulares sobre esse assunto. Mas eu respondia: Não, isso foi apenas uma busca que eu fiz para o meu próprio consumo; era só para tirar algumas dúvidas que assaltavam os meus pensamentos de vez em quando. Na realidade, eu buscava descobrir também os motivos pelos quais nós os pregadores não revelávamos a verdade sobre os pais e a verdadeira identidade e natureza deste filho órfão, adotado pela maioria das igrejas evangélicas, chamado Dízimo, o qual, em alguns casos, se tornou quase senhor delas. Eu queria saber também porque os pregadores, por maioria, adotaram o Dízimo e não quiseram adotar outros irmãos dele, tais como o Sábado, a Primogenitura, a Circuncisão, o Levirato, discriminando-os sem motivos aparentes, pois todos eles foram, igualmente como o dízimo, adotados também pela Velha Aliança (a Lei). Seria porque o dízimo é rico e os seus irmãos, pobres?

Mas no comecinho deste ano de 2006, eu separei um tempo e resolvi colocar no papel o que estava na minha memória, e expor a verdade, desnudando-a diante da Igreja e revelando o engano que, com interesse e esperteza, foi montado em cima desse filho da Velha Aliança (a Lei), a qual, à semelhança do rei Jeorão, se foi sem deixar de si saudades [II Crônicas 21]. Faço-o também por desencargo de consciência, porque descortinando a verdade sobre esse polêmico tema, não poderia deixar de levá-la ao conhecimento da santa grei, visto que também já fui pregador do dízimo. Após uma honesta pesquisa e um criterioso estudo, revisei os meus conceitos sobre essa doutrina. E, agora, após o estudo sério deste livrete, se alguém ainda pregar que o dízimo é doutrina para a Igreja, não poderei considerá-lo um legítimo pregador, mas um enganador! E até me atrevo a convidar esse pregador para uma conversa amigável, mas muito séria sobre esse assunto, com mentes e Bíblias abertas: ele de lá e eu de cá, cara a cara, vis-à-vis, face to face. Proponho-me a lhe mostrar definitivamente que o dízimo não é doutrina bíblica para a Igreja. E mais. Que existem outros assuntos, sobre os quais o Senhor Jesus e os apóstolos falaram diversas vezes, com acentuada ênfase, e para os quais os pregadores não atentam com o mesmo afinco e interesse com que tratam o dízimo. Por que será? Será por quê?

Pasmem! Enquanto rabiscava estas páginas, deparei-me com um livrinho sobre o dízimo. Li-o com sofreguidão, para ver se achava alguma idéia interessante. Encontrei nele pouco mais do que a mesmice. Para ser justo, achei duas novidades: Uma. O Autor não citou um versículo sequer do Novo Testamento, para fundamentar o seu arrazoado. Nem mesmo aquele das três palavrinhas: sem omitir aquelas. Duas. Mas teve a coragem de atribuir a longevidade de Abraão, o primogênito de Terá [Gênesis 11], morto aos 175 anos [Gênesis 25], ao suposto fato de ter sido ele um dizimista fiel! Pois bem, diante dessa extraordinária descoberta científica, busquei na matemática a regra de três, para aferir essa descoberta; e, efetuados os cálculos, concluí que Matusalém (primogênito de Enoque — o homem que andava com Deus, e que Deus tomou para si — e avô de Noé [Gênesis 5]), morto aos 969 anos [Gênesis 5], devia pagar uns 55,37% dos seus ganhos, pois: 175 anos estão para 10 (dízimo), assim como 969 anos estão para X. Logo, X é igual a 55,37! Ou então Matusalém é que era dizimista fiel e não Abraão, pois viveu bem mais tempo do que ele! Confesso que essa leitura me causou um grande mal-estar. Por essas e por outras, esse Autor já me deixou uma profunda impressão de que ele não passa de um enganador.

Você já ouviu e leu isto muitas vezes e sabe que foi ELE quem disse: Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará [João 8]. Vamos então neste livrete investigar a verdade, fazendo um estudo sério e criterioso sobre o dízimo, e ilustrando-o com fatos atuais — alguns, bastante extravagantes, outros, até esdrúxulos. E descobrindo a verdade, você se libertará do engano e da opressão financeira religiosa. E de consciência tranqüila, sem medos e sem sustos, saberá como se portar diante dessa doutrina e dos doutrinadores, se você é ovelha. E se você é doutrinador, conhecendo bem essa verdade, deixará de impor essa doutrina equivocada, opressora e ameaçadora ao rebanho.

Sei que em alguns momentos, posso parecer irreverente no trato desse assunto, mas não é nada disso. São apenas recursos que eu uso para descontrair e aliviar um pouco a dor que o coração sente, ao ver tanta coisa que se impõe a esse povo santo, que foi libertado para a liberdade, submetendo-o de novo a jugo de escravidão [Gálatas 5].

E aí está o livrete. Peço-lhe, então, que ao lê-lo releve meus erros (pois descobri em tempo que eu não sou infalível!), e especialmente a falta de clareza das minhas explanações. E por causa disso, peço-lhe mais uma coisa: Quando a explanação de um texto não estiver muito clara, bem inteligível, leia-a novamente até que ela se torne clara e compreensível. É assim que hoje eu costumo fazer, quando estou diante de um texto pouco claro ou de difícil compreensão. Desde já, obrigado pela sua tolerância e condescendência. E vamos ao estudo.

(A tradução da Bíblia que eu uso é a de João Ferreira de Almeida, revista e atualizada, publicada pela Sociedade Bíblica do Brasil nos idos de 1960. Dou essa informação, porque pode haver divergência de palavras na tradução, que não permita o mesmo entendimento).

A quem não tem medo da verdade

Começo este estudo propondo uma pergunta, que cada leitor deve responder antes da leitura e estudo deste livrete. Você acredita que a prática do dízimo, como é ensinada na Bíblia, é para a Igreja? [ ] Sim [ ] Não [ ] Sem opinião

Antes de tudo, quero deixar bem claro que eu não tenho nada contra quem queira dar o dízimo à sua igreja ou ao pastor. Afinal, o dinheiro é seu, você o ganhou com o suor do rosto (espero!), portanto você faz dele o que bem lhe aprouver! Também não tenho a intenção de criar polêmica com este trabalho, embora esteja consciente de que vou desagradar a muitos pregadores. Nem tenho a presunção de ser o dono da verdade e de saber tudo; tanto que se você encontrar alguma coisa nesse arrazoado que não esteja bem fundamentada nos fatos e na Bíblia me alerte, por favor. Acho mesmo que muita coisa equivocada que se ensina sobre o dízimo — com raras exceções — deve-se à tradição ou ao costume: Eu ouvi e aprendi assim, como sendo a verdade; e ensinei assim, como sendo a verdade, sem ter examinado cuidadosamente o assunto por mim mesmo. (Não dizem por aí, que o uso do cachimbo entorta a boca?). Eu conheço defensor da prática do dízimo, que não entrega o dízimo. Ele defendeu a doutrina, fui verificar, e não achei o nome dele na execrável relação dos dizimistas, afixada na entrada do templo! E foi de tanto ouvir, ler e eu mesmo dizer disparates sobre o dízimo, que resolvi um dia fazer uma paciente e cuidadosa releitura da Bíblia, para descobrir por mim mesmo a verdade sobre esse assunto, com base exclusivamente nos textos bíblicos e nos fatos; e sem as influências das interpretações muito bem montadas, tendenciosas e interesseiras. Venho fazendo isso há mais de seis anos e sempre comparando com o que é ensinado. E a cada dia que passa, eu me convenço de que o que eu estou expondo aqui está correto.

Nos meus 53 anos de vida cristã evangélica, já ouvi, li e falei disparates desse jaez:

§ Como sabemos, o dízimo foi criado para o sustento dos levitas;
§ A única maneira de abrir as janelas dos céus é pagando o dízimo;
§ A prática do dízimo é fundamental para a nossa salvação;
§ Sou dizimista porque os pensamentos de Deus são mais altos. (Ainda não entendi o que o autor quer dizer com isso!);
§ O dízimo é para nós como o fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal para Adão. Caso o comamos ou o retenhamos em casa ou o administremos, estaremos fazendo o mesmo que Adão fez, substabelecendo nossos direitos, bens, a família e toda nossa vida a Lúcifer e à própria morte. (Arre!).

Este é, pois, um livro escrito por quem busca a verdade e não tem medo dela; e se destina a quem igualmente busca a verdade e não tem medo dela. Se esse é o seu caso, continue lendo. Se não, desista agora, porque do contrário não vai tirar nenhum proveito desta leitura. Como se trata da busca da verdade, não é um livro para ser lido às pressas; especialmente porque serão indicadas muitas referências bíblicas, as quais devem ser buscadas e lidas. Portanto tire um tempo para lê-lo, ou melhor, para estudá-lo, com vagar e com muita atenção; e fazer uma avaliação criteriosa do seu conteúdo. Por ser um livro pequeno — daí ser chamado livrete —, dá para lê-lo duas ou mais vezes, em pouco espaço de tempo. Para compreendê-lo melhor e tirar maior proveito do estudo, o leitor precisa ter a Bíblia à mão e ler cuidadosamente as referências bíblicas indicadas; e, como ajuda, recorrer ao glossário no final do livrete, para rebater as dúvidas sobre as palavras pouco usuais. Eu diria que talvez esse estudo devesse ser feito em grupo ou por pelo menos duas pessoas juntas, pois enquanto uma pessoa lê o livro, a outra busca as referências bíblicas, e ambas lêem o texto e o comentam. Não deixe de fazer, ao fim de cada tópico, as anotações e os comentários que desejar.

Com o propósito de levar você a examinar por si mesmo os textos bíblicos, não vou indicar os versículos, como se faz comumente num estudo bíblico. Somente vou indicar o livro e o capítulo, e, eventualmente, transcrever um texto bíblico, para facilitar a compreensão. Não vou pôr a comida mastigada e digerida na sua goela, como fazem algumas aves com seus filhotes. Pois acredito que num estudo investigativo e criterioso da verdade, a indicação de um versículo isolado pode ser até muito perigosa. Veja: Eu ensino uma doutrina falsa, e digo que o fundamento dela está no versículo tal — às vezes, só no final dele, ou, como se costuma dizer, na parte b —, e você confere na hora, acha e se convence de que o que eu disse é verdadeiro. Ocorre que eu omiti o contexto e usei o pretexto, e você caiu direitinho no meu conto!

Exemplifico. Há pouco tempo, ao terminarmos a visita que fazíamos, minha amiga abriu a Bíblia e leu alguns versículos no livro de Jó, onde Elifaz, um dos seus três amigos, fez um discurso e emitiu conceitos sobre Deus. Todavia suspeitei que houvesse alguma coisa errada. Em casa, fui investigar. De fato, o que os amigos de Jó disseram a respeito de Deus tinha sido considerado por Deus mesmo inadequado, pecaminoso: A minha ira se acendeu contra ti, e contra os teus dois amigos; porque não dissestes de mim o que era reto, como meu servo Jó. Por causa disso, Elifaz teve de ir a Jó e pedir que oferecesse holocaustos por ele e pelos dois outros amigos. O contexto distante, ou melhor, o texto lá no fim do livro esclarece isso [Jó 42]. Um ano depois, encontrei a minha amiga e ela me contou que também já tinha se dado conta do equívoco. Imagine agora o desastre que seria um sermão pregado com bastante entusiasmo, tendo por base essas enganosas palavras de Elifaz e de seus dois amigos!

Duas curiosidades sobre o dízimo

Ao fazer a tal releitura da Bíblia, deparei-me com duas coisas muito curiosas a respeito do dízimo, as quais chamaram a minha atenção, e que eu vou lhe contar agora. Foi assim. Um dia, enquanto descansava de uma caminhada matinal, à sombra de uma frondosa árvore no campo, e com base na releitura de um texto que acabara de fazer, ocorreu-me uma extravagante e absurda pergunta, que ali mesmo elaborei nestes termos:

Onde na Bíblia, o dizimista foi instruído a beber pinga,
na casa de Deus, comprada com o dinheiro do dízimo?

Confesso que fiquei meio atarantado com essa possibilidade!

Alguns dias depois disso, criei coragem e fiz essa pergunta a um pastor. Ele pulou desta altura... e me disse com veemência: Não existe tal coisa na Bíblia! Caramba! E agora, será que eu disse uma asneira? Eu já estava assustado com o meu atrevimento, e fiquei mais ainda com a reação desse pastor. Porém outro pastor, equilibrado, sensato, conhecendo-me de longo tempo, a quem também fiz essa pergunta, pediu-me um prazo para pesquisar e responder. Dentro de alguns dias, telefonou-me dando a resposta. Ele havia achado o mesmo texto em que eu baseara essa pergunta! Não muito tempo depois, por telefone, eu fiz a dita pergunta a outro pastor. Disse-me ele que não sabia, e me pediu para indicar o texto. Insisti com ele, que procurasse. Mas ele me disse não dispor de tempo. Então sugeri que ele pedisse a um dos seus filhos para procurar para ele, ao que me respondeu: Não! Não posso deixar os meus filhos verem uma coisa dessas! Ele também tinha ficado assustado com essa possibilidade. Cinco anos depois, com euforia e com um largo sorriso, ele me deu a resposta. Não demorou muito, no velório de um pastor, encontrei um pastor conhecido que se fazia acompanhar de outro pastor (este estava vivo!), e lhes fiz a importuna pergunta. Eles responderam que não sabiam. Naquele mesmo instante se aproximou um professor de seminário; então o pastor disse: Este aqui sabe. Fiz-lhe a pergunta, e ele sem precisar abrir a Bíblia e sem pestanejar, deu a resposta certa na hora! Diante de tudo isso, a pergunta já não me pareceu tão extravagante e tão absurda.

E você aí que estuda a Bíblia, ensina, discipula, prega ou escreve sobre o dízimo, saberia dizer em que livro e capítulo fica o texto, em que se baseia essa importuna pergunta sobre essa tão difundida e defendida doutrina?

A segunda curiosidade que encontrei foi a oração do dizimista. Essa foi demais para mim. Eu nunca tinha ouvido ou lido qualquer coisa sobre essa oração. Não me ensinaram nadica de nada sobre ela. Ensinaram-me que tinha de pagar o dízimo de tudo, inclusive do meu salário bruto, pois se não pagasse estaria roubando a Deus e que, além de me privar das bênçãos, cairia nas maldições de Malaquias. E a todo o tempo, a oração do dizimista estivera lá na minha Bíblia — e deve estar na sua também —, conforme foi ordenado ao dizimista fazer! Como não pude enxergar tal coisa, se já havia lido a Bíblia muitas vezes? E aí, meu caro e assustado leitor, eu fiquei confuso, porque eu descobri que não poderia em sã consciência fazer essa oração para cumprir a ordenança bíblica, visto que se a fizesse estaria dizendo inverdades. Só o judeu podia fazê-la... e eu não sou judeu! Aí, entendi porque nunca me ensinaram essa oração e nem me falaram sobre ela. E lá vai o texto:

Dirás perante o Senhor teu Deus (esta é a oração do dizimista):

Tirei o que é consagrado de minha casa, e dei também ao levita, e ao estrangeiro, e ao órfão e à viúva, segundo todos os teus mandamentos que me tens ordenado: nada transgredi dos teus mandamentos, nem deles me esqueci. Dos dízimos não comi no meu luto, e deles nada tirei estando imundo, nem deles dei para a casa de algum morto: obedeci à voz do Senhor meu Deus; segundo a tudo o que me ordenaste, tenho feito. Olha desde a tua santa habitação, desde o céu, e abençoa o teu povo Israel, e a terra que nos deste, como juraste a nossos pais, terra que mana leite e mel.

Quer ler novamente essa oração bem devagar e com redobrada atenção, e ver se há possibilidade de um cristão pronunciá-la hoje, palavra por palavra, como foi determinado ao dizimista fazer, e sem faltar com a verdade?

Encontrei um católico na Internet, que entendeu que não era possível ao cristão fazer essa oração; então ele inventou uma. Ei-la:

Oração do Dizimista

Recebei Senhor, minha oferta!
Não é esmola, porque não sois mendigo.
Não é uma contribuição, porque não precisais.
Não é resto que me sobra que vos ofereço.
Essa importância representa, Senhor, meu reconhecimento, meu amor.
Pois se tenho, é porque me destes.
Amém.

A intenção desse católico dizimista pode ter sido boa, mas foi ingênua, pois não atendeu as instruções transmitidas por Moisés: São estes os estatutos e os juízos que cuidareis de cumprir na terra que vos deu o Senhor, Deus de vossos pais, para a possuirdes todos os dias que viverdes sobre a terra. Nem satisfez a exigência feita por Deus: Tudo o que eu te ordeno, observarás; nada lhe acrescentarás nem diminuirás [Deuteronômio 12].

Também não me parece apropriada nem condizente com a oração do dizimista, e muito menos ainda com o ensino evangélico, a oração de um bispo tupiniquim, que se diz dizimista fiel. Veja o seu testemunho: Imediatamente, como dizimista que sou, ergui o braço, em que uso a minha fita onde está escrito: “Ó, Deus! Não se esqueça que eu sou dizimista fiel”, e me pus a reivindicar os meus direitos. Orei: “Meu Deus, envia um anjo lá, agora, para resolver essa situação, pois, como dizimista, eu exijo uma solução. Amém”. (Grifei). [Folha Universal, n. 728, de 19 a 25 de março de 2006]. Esse bispo nem invocou o nome do Senhor Jesus, foi logo exigindo de Deus uma solução imediata para um problema, com base nos seus supostos méritos de dizimista fiel. Até parece um consumidor exigindo os seus direitos perante o fornecedor; ou alguém mandando o seu cão se deitar! Será que essa autoridade toda lhe adveio do fato de um bispo tê-lo consagrado bispo também? Achei essa oração muito insolente, estúpida e blasfema! Só porque alguém lhe deu o título de bispo, e ele carrega no pulso uma fitinha de dizimista fiel, deixou de ser servo do Senhor e passou a ser senhor do Senhor? Contenha-se, senhor bispo! Ou, como diria um político moderno: Recolha-se à sua insignificância!

Eu falei lá em cima que somente indicaria o livro e o capítulo. Mas nos dois casos citados acima, eu vou abrir uma exceção: não vou indicar nem o livro, nem o capítulo! Você que procure. Se você não achar, peça ao seu discipulador, pastor, bispo, apóstolo, paipóstolo ou patriarca (não sei se a ordem hierárquica é essa) para lhe mostrar os textos onde se encontram essas duas preciosas curiosidades.

Como investigar?

Para facilitar a compreensão dos textos bíblicos que você vai ler, nessa busca da verdade sobre o dízimo, sugiro que use dois lápis de cor: um vermelho e o outro azul. Com o vermelho, marque toda frase que mencionar a terra (não o planeta Terra, mas a terra de Canaã — território geográfico), especialmente a expressão: Quando o Senhor teu Deus te introduzir na terra... e outras equivalentes. E com o azul, marque tudo que você encontrar sobre o dízimo. Já adianto: você não vai achar muita coisa para marcar de azul, não. Depois, leia esses textos marcados uma, duas, três ou mais vezes. Fazendo assim, você vai ver como a compreensão deste e de muitos outros assuntos ficará mais fácil.

Mas há duas coisas que eu reputo importantíssimas, e que você deve ter em mente quando estiver examinando o Pentateuco, ou seja, os cinco primeiros livros da Bíblia: Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio, também chamados pelos judeus de Torá de Moisés ou simplesmente Torá.

A primeira é a formação da nação israelita ou judaica. O povo hebreu (também chamado judeu ou israelita) viveu no Egito cerca de quatrocentos e trinta anos [Êxodo 12], e por muito tempo sob pesada escravidão [Êxodo 1]. Durante esse período, não teve templo, religião formal, ou leis próprias, e viveu na cultura e de acordo com as leis e os costumes do povo egípcio. Aliás, esse povo nem tinha experiências com Deus. Conhecia Deus somente de ouvir falar, e mesmo assim como Deus de Abraão, Deus de Isaque e Deus de Jacó [Êxodo 6]. A única coisa que o ligava fortemente ao patriarca Abraão (fundador dessa raça) era a circuncisão, ou seja, uma marca que era feita no pênis (no pintinho) de cada menino aos oito dias de nascido. (Ai, coitadinho, sem anestesia!).

Quando Jacó, também chamado Israel [Gênesis 32], migrou de Canaã para o Egito, foi com um grupo de apenas setenta pessoas [Gênesis 46, Deuteronômio 10], ou de setenta e cinco, na contagem do diácono Estêvão [Atos 7], mas levava consigo a promessa de que Deus faria dele no Egito uma grande nação [Gênesis 46]. Agora, no regresso dos seus descendentes, deveria contar com nada menos de dois milhões de pessoas. O primeiro censo realizado logo após a saída do Egito, nos dá conta de que só de homens de vinte anos para cima, capazes de sair à guerra, eram seiscentos e três mil quinhentos e cinqüenta, sem contar os levitas [Números 1]. Quase quarenta anos depois, como preparação para a entrada na terra prometida, fez-se nova contagem. Veja o resultado: o número dos aptos para a guerra havia baixado para seiscentos e um mil setecentos e trinta; enquanto o número dos levitas subira de vinte e dois mil para vinte e três mil [Números 26].

A segunda é a promessa. Esse povo aguardava o cumprimento de uma promessa, que Deus fizera, sob juramento, aos três patriarcas, de que um dia a sua descendência possuiria a terra de Canaã [Gênesis 12, 26, 28]. Essa esperança era tão arraigada, que Jacó ou Israel — como passara a ser chamado —, depois de viver na terra do Egito durante dezessete anos, e aos cento e quarenta e sete de idade, sentindo a morte chegar, e já quase cego, chamou seu filho José e o fez jurar, com a mão sob a sua coxa, que não o enterraria no Egito, mas levaria seus restos mortais para serem enterrados na terra prometida, na caverna no campo de Macpela, que Abraão comprara de Efron, por quatrocentos siclos de prata, e onde tinham sido enterrados Sara, Abraão e Isaque [Gênesis 23, 35, 50]. Logo depois, expressou sua esperança: Eis que eu morro, mas Deus será convosco, e vos fará voltar à terra de vossos pais [Gênesis 47, 48]. E o próprio José, perto da morte, demonstrando também a sua esperança, fez seus irmãos jurarem que, quando Deus os visitasse para cumprir a promessa, levariam os seus ossos para a terra de Canaã, onde seriam sepultados. O que efetivamente foi feito [Gênesis 50, Êxodo 13, Josué 24].

Até que enfim chegou o grande e esperado dia do cumprimento da promessa!

A medida da iniqüidade dos amorreus se enchera e Deus viu a aflição do seu povo e desceu a fim de livrá-lo da mão dos egípcios e para fazê-lo subir daquela terra a uma terra boa e ampla, terra que mana leite e mel [Gênesis 15, Êxodo 3].

Essas duas coisas são importantíssimas, porque os mandamentos, estatutos, testemunhos e juízos, entregues por Moisés a esse povo, tinham como propósito prepará-lo para viver em liberdade, governar-se a si mesmo como nação e a se tornar testemunhas de Jeová (não como esses modernos que vão em dupla, de casa em casa, vendendo revistas), no meio dos povos que habitavam a terra da promessa [Gênesis 12, 15; Êxodo 19; Deuteronômio 4, 6; Isaías 42, 43 e 44], pois desse povo viria a Salvação [I Crônicas 16, João 4]. De modo que, ao entrar na terra prometida, Israel não poderia mais viver de acordo com os costumes egípcios, em que vivera por mais de quatro séculos, nem adotar os costumes dos povos cananeus: Não fareis segundo as obras da terra do Egito, em que habitastes, nem fareis segundo as obras da terra de Canaã, para a qual eu vos levo, nem andareis nos seus estatutos. Como viver então? Por isso lhe foi dada toda aquela legislação, que se encontra naqueles livros. Ali, estavam a sua Constituição (a Carta Magna), suas leis civis, militares, penais, trabalhistas, os direitos de família, os preceitos e cerimônias religiosos, todos fundamentais para a sua sobrevivência: Fareis segundo os meus juízos, e os meus estatutos guardareis, para andardes neles: Eu sou o Senhor vosso Deus. Portanto os meus estatutos e os meus juízos guardareis; cumprindo os quais, o homem viverá por eles: Eu sou o Senhor vosso Deus [Levítico 18]. Também não se pode esquecer de que Israel seria uma teocracia, isto é, teria um governo em que a autoridade, emanada de Deus, seria exercida por seus representantes, ou seja, os sacerdotes.

Vejo, pois, esse povo, recém saído do cativeiro egípcio, como crianças, que tiveram de ser ensinadas sobre todas as coisas, até mesmo sobre as mais simples e algumas até bizarras: como tratar o animal do inimigo e do próximo [Êxodo 23, Deuteronômio 22]; a obrigação que tinha o sacerdote de usar cuecas [Êxodo 28]; o que fazer quando a mulher estivesse menstruada [Levítico 15]; o direito de retrovenda de imóvel residencial urbano [Levítico 25]; a execução da pena de morte [Deuteronômio 19]; as condições para convocação e dispensa dos homens para a guerra [Deuteronômio 20]; como tratar a mulher prisioneira; acerca dos filhos desobedientes [Deuteronômio 21]; a vestimenta que o homem e a mulher não deveriam usar; o procedimento para a captura de um passarinho (bem ecológica essa, não?); não misturar sementes de espécies diferentes na mesma área da lavoura; as relações sexuais proibidas [Deuteronômio 22]; a exclusão de pessoas da assembléia; a cobrança ou não de juros do irmão de raça ou do estrangeiro nos empréstimos de dinheiro; e, pasmem, até a fazer cocô! [Deuteronômio 23]. Desse modo, ao final da sua carreira e da sua vida, Moisés podia gabar esse povo dizendo: Eis que vos tenho ensinado estatutos e juízos, como me mandou o Senhor meu Deus, para que assim façais no meio da terra que passais a possuir. Guardai-vos, pois, e cumpri-os, porque isto será a vossa sabedoria e o vosso entendimento perante os olhos dos povos que, ouvindo todos estes estatutos, dirão: Certamente este grande povo é gente sábia e entendida. Pois que grande nação há que tenha deuses tão chegados a si como o Senhor nosso Deus, todas as vezes que o invocamos? [Deuteronômio 4].

Abraão, o dizimista

Geralmente Abraão é visto ou apresentado, nos nossos dias, por alguns pregadores desavisados, como um modelo de dizimista fiel.

Vamos examinar, então, esse ponto de vista. Abra a sua Bíblia e leia Gênesis 12, onde está o relato do começo da história dos hebreus ou judeus, como passaram a ser mais conhecidos. Aí está a chamada de Abrão (nome que mais tarde foi mudado para Abraão). Pode começar a usar o seu lápis vermelho. Eis a ordem de Deus: Sai da tua terra,... e vai para a terra que te mostrarei... Eis a obediência de Abraão: Partiram para a terra de Canaã e lá chegaram... Observe que ele foi chamado para sair da sua terra e ir para outra terra, que ele não conhecia. Tão logo chegou à terra de Canaã, Deus lhe revelou que essa era a terra. Eis a promessa de Deus: Darei à tua descendência esta terra. Logo depois, Abraão ficou sabendo que a posse dessa terra somente se concretizaria na sua descendência após quatro séculos: Sabe, com certeza, que a tua posteridade será peregrina em terra alheia, e será reduzida à escravidão, e será afligida por quatrocentos anos. Mas também eu julgarei a gente a que têm de sujeitar-se; e depois sairão com grandes riquezas. E tu irás para teus pais em paz; serás sepultado em ditosa velhice. Na quarta geração tornarão para aqui; porque não se encheu ainda a medida da iniqüidade dos amorreus. Naquele mesmo dia fez o Senhor aliança com Abrão, dizendo: À tua descendência dei esta terra, desde o rio do Egito até o grande rio Eufrates [Gênesis 15].

E como Abraão não era bobo nem nada, sabendo que a posse da terra não viria no seu tempo, e que viveria nela como estrangeiro, deu um jeito de comprar um pedacinho de terra para sepultar sua mulher e, depois, ele mesmo ser também sepultado nela [Gênesis 23].

Já na terra de Canaã, Abraão se separou do seu sobrinho Ló. Abraão era um homem muito rico, possuidor de grande rebanho, de sorte que a terra já não comportava os dois, visto que Ló também tinha seu numeroso rebanho [Gênesis 13]. Após essa separação, Abraão teve de entrar numa guerra de quatro reis contra cinco para socorrer seu sobrinho, que tinha sido levado cativo. Ele lutou do lado dos cinco, e dela se saiu vencedor. Então Abraão deu ao misterioso rei e sacerdote Melquisedeque o dízimo de tudo [Gênesis 14]. Não das dízimas da terra prometida, pois ele nunca teve a posse da terra! Foi um gesto voluntário e de acordo com os costumes antigos. Não havia preceito. Agora, veja à luz do próprio texto e de Hebreus 7, que nesse tudo não estavam incluídos as dízimas da terra, tanto do grão do campo, como do fruto das árvores [Levítico 27], nem os bens particulares de Abraão: seu gado, seu ouro e prata, mas somente os despojos, ou seja, os bens que eles tinham tomado dos inimigos derrotados. Aliás, bens que Abraão até desprezou, visto que nada quis daquilo para si, posto que, além de ser um homem muito rico, recebera recentemente muitos presentes do Faraó do Egito. Observe que ele foi para essa guerra com 318 homens guerreiros, dos mais capazes, nascidos em sua casa, isto é, filhos dos seus servos e servas, o que denota o quanto ele era rico [Gênesis 12, 13, 14]. Portanto não houve nesse gesto de dar o dízimo a Melquisedeque o hoje tão propalado sacrifício, que libera as bênçãos provenientes da entrega do dízimo, e que alguns pregadores procuram inculcar nos dizimistas!

Reflita e responda: Ficaria bem você entrar numa briga e espoliar alguém e levar ao tesoureiro da igreja o dízimo desse espólio? [ ] Sim [ ] Não. Acha que esse dízimo seria aceito e se tornaria em fonte de bênção? [ ] Sim [ ] Não
Considere isto: temos notícia de uma única vez que Abraão pagou o dízimo; e só por isso é hoje geralmente chamado de dizimista pelos pregadores afoitos. Porém a mesma Bíblia registra que ele mentiu duas vezes: ao Faraó do Egito e a Abimeleque, rei de Gerar [Gênesis 12, 20].

Reflita outra vez e responda: Seria correto hoje, com mais razão ainda, só por causa dessas duas mentiras, chamá-lo de mentiroso? [ ] Sim [ ] Não

Se você respondeu Sim para essa última pergunta, pode-se dizer que Abraão foi dizimista uma vez e mentiroso duas vezes; e isso justificaria chamá-lo também de mentiroso e não somente de dizimista!

O dízimo é anterior à Lei

Esse é o forte argumento comumente usado pelos pregadores do dízimo, para rebater os cristãos recalcitrantes, não dizimistas, que afirmam que o dízimo é da lei. Realmente, parece um argumento e tanto, bastante robusto, irretorquível. Mas acompanhe passo a passo o raciocínio a seguir.

Os preceitos que se seguem também são anteriores à lei, e foram incorporados a ela, mas nem por isso nos sentimos obrigados a observá-los, e nem somos ensinados a fazê-lo:

*A distinção entre animal limpo e animal imundo, e a conseqüente proibição de comer a carne deste último [Gênesis 7, Levítico 11];
*A circuncisão [Gênesis 17, 21; Josué 5];
*O sacrifício de animais [Gênesis 15; Êxodo 20, 24; Levítico 1 e seguintes];
*A consagração dos primogênitos dos homens e dos animais a Deus [Êxodo 13, Números 3];
*O levirato [Gênesis 38, Deuteronômio 25];
*A celebração anual da páscoa [Êxodo 12, 23; Josué 5];
*A guarda do sétimo dia (sábado) [Gênesis 2; Êxodo 16, 20, 23].

Você certamente concorda comigo nisso, mas poderá levantar uma forte objeção: É verdade, o raciocínio acima parece lógico, mas o dízimo aparece também no Novo Testamento, logo deve ser observado, pois ficou inserido no contexto do evangelho! Então vamos continuar investigando o caso.

*A distinção entre animal limpo e animal impuro aparece também no Novo Testamento. O apóstolo Pedro tinha dificuldade com isso, mas parece que esse problema foi resolvido, pelo menos em relação aos gentios [Atos 10, 11, 15];
*A circuncisão também está no Novo Testamento, e está relacionada à pessoa mais importante. E foi justamente no dia da sua circuncisão, quando completou oito dias de vida, que ele recebeu o seu nome: Jesus [Lucas 2]. Aliás, a prática da circuncisão até aparece lá bem na frente. O próprio apóstolo Paulo circuncidou Timóteo, filho de uma judia crente e pai grego [Atos 16];
*De igual modo, o sacrifício de animais. Na consagração do primogênito Jesus, foram sacrificados um par de rolas e dois pombinhos [Lucas 2];
*E como estava escrito na lei, ele foi também consagrado ao Senhor na condição de primogênito [Lucas 2];
*O levirato, por sua vez, ainda era praticado nos dias do Senhor Jesus. Os saduceus nos dão notícia disso nos três Evangelhos [Mateus 22, Marcos 12, Lucas 20];
*A celebração anual da Páscoa, também. E o próprio Senhor Jesus a celebrou [João 2, 13, 18; Mateus 26];
*E até o polêmico sábado era observado [Lucas 4, 23; Mateus 24].

E o que dizer do voto? Não me refiro ao voto com o qual elegemos os bons (pouquíssimos) e os maus (muitíssimos) políticos para os cargos públicos. Falo da promessa votiva, isto é, da promessa com que uma pessoa se obriga para com Deus. Aliás, a obrigação do dízimo para os israelitas, a meu ver, nasceu do voto de Jacó (portanto antes da outorga da lei). Em diversas ocasiões, Deus deu longas e detalhadas instruções a Moisés sobre o voto, particularmente o de nazireu [Levítico 27; Números 6, 30; Deuteronômio 23]. Os nazireus mais conhecidos da Bíblia são: Sansão [Juízes 13], Samuel [I Samuel 1], João Batista [Lucas 1, 7]. No Novo Testamento, temos notícia de que o apóstolo Paulo raspou a cabeça, em Cencréia, por ocasião da sua segunda viagem missionária, por ter tomado ou feito voto [Atos18]. E foi exatamente pelo seu envolvimento no cumprimento de votos alheios, feitos por quatro homens, quando seguia sugestões dos apóstolos, que acabou sendo preso e processado em Jerusalém, o que pôs fim à sua carreira missionária e resultou na sua ida a Roma, para julgamento perante o tribunal do imperador César [Atos 21 a 29].

Então reflita novamente e responda: Estamos sendo ensinados a observar esses importantes preceitos acima mencionados, que à semelhança do dízimo, existiram antes da lei e foram a ela incorporados e eram observados nos tempos do Novo Testamento? [ ] Sim [ ] Não.

Por que será que somente o dízimo é ensinado e com tanta ênfase, com promessas e maldições? (Conheço as poucas exceções). Não parece ser um ensino enganoso, muito bem montado sobre a verdade, tendencioso e muito vantajoso para o doutrinador? [ ] Sim [ ] Não.

É por isso que eu digo: É o engano cavalgando a verdade.

Tome tento, leitor! Nem tudo o que foi ordenado ou ensinado na Bíblia, os cristãos praticam, ou são ensinados a praticar. Quer ver? Se você tem um filho contumaz e rebelde, que não obedece ao pai nem à mãe, e mesmo quando castigado não dá ouvidos a seus pais, o que fazer com ele, segundo o que está ordenado na Bíblia? Deuteronômio 21 prescreve direitinho o que se devia fazer com ele! Leia o texto com bastante atenção, e descubra por si mesmo. E o que você pensa disto?: Se o teu olho direito te faz tropeçar, arranca-o e lança-o de ti..., Se tua mão direita te faz tropeçar, corta-a e lança-a de ti... Conheço muita gente que anda tropeçando (inclusive pregadores do dízimo), mas ainda não vi ninguém que tenha arrancado o olho direito ou a mão direita por causa desse conselho do Senhor Jesus! No Novo Testamento, Tiago dá instruções detalhadas sobre algumas providências que o cristão deveria tomar diante de certas circunstâncias: Está alguém entre vós sofrendo? Faça oração. Está alguém alegre? Cante louvores. Está alguém entre vós doente? Chame os presbíteros da igreja, e estes façam oração sobre ele, ungindo-o com óleo em nome do Senhor [Tiago 5]. (Não seria esse o Plano de Saúde dos cristãos, que deveria ser mantido pela fé?). Não parece ser esse o ensino ou a prática da igreja em geral. Talvez as duas primeiras providências tenham merecido alguma atenção. Mas a última tem sido sistematicamente desprezada. Nesse caso, pelo menos, não se toma a Bíblia como palavra de Deus! Quem sabe por isso muitas igrejas já nem elegem ou constituem presbíteros, como era costume no início do cristianismo [Atos 14, Tito 1]? O presbítero se tornou uma figura dispensável. Ou será porque já não estão encontrando homens com as qualidades de um presbítero dos primeiros dias da Igreja? Mas alguém pode argumentar: Os pastores e os bispos ocupam o lugar dos presbíteros. Que seja. Então porque não são chamados para aquele mister; e, quando chamados, não se obtém o resultado buscado de cura, como está dito na epístola de Tiago? Alguma coisa deve estar errada! Precisamos reexaminar a nossa teologia, nossas doutrinas ou, quem sabe, a nossa fé!

Há algum tempo, formulei uma pergunta com base nessa orientação de Tiago, nos seguintes termos: Em que circunstância, uma pessoa (homem ou mulher), incrédula, ímpia e até blasfema substitui o presbítero?
Ninguém a quem eu fiz a pergunta atinou com a resposta. Ora, o que se vê hoje, é que se alguém da igreja está enfermo, a providência é chamar o médico (ou levar o enfermo a ele), seja ele reconhecidamente ateu, ímpio e até blasfemo, não importa; e não chamar os presbíteros da igreja, como recomenda Tiago. Viu como nessa circunstância essa pessoa incrédula, ímpia e até blasfema substituiu o presbítero?

Dízimo x Sábado

Ultimamente se tem dado muita ênfase à prática do dízimo. Até a Igreja Romana, que o adotou em tempos passados e dele desistira, voltou a pregá-lo. Não com a violência com que alguns pregadores evangélicos o fazem: ameaçando, excluindo da igreja ou não permitindo que o não dizimista dela participe; mas com argumentos piedosos, suaves, persuasivos, longe da síndrome de Malaquias e bem distante da síndrome da maluquice. Em face dessa importância que se tem dado à prática do dízimo, quero fazer uma observação. Ou melhor, levar o leitor a fazer uma comparação do dízimo com o sábado, que poderá trazer mais luz a essa investigação. Em poucas palavras, quais as conseqüências imediatas, se não se desse o dízimo, conforme nos informa Malaquias 3? Com maldição sois amaldiçoados, porque a mim me roubais, vós, a nação toda. E o que aconteceu com o primeiro israelita que infringiu o preceito da guarda do sábado (cuja ordenança é anterior à do dízimo, e foi repetida diversas vezes), quando foi pego apanhando lenha para cozinhar o seu guisado [Êxodo 16, 20; Levítico 27]? Tal homem será morto; toda a congregação o apedrejará fora do arraial. Levou-o, pois, toda a congregação para fora do arraial, e o apedrejaram; e ele morreu, como o Senhor ordenara a Moisés [Números 15]. A inobservância do preceito do sábado teve conseqüências mais graves do que a inobservância da prática do dízimo.

Agora, puxe pela memória. Algum pregador já ameaçou você de morte, de maldições ou de exclusão da igreja, por não observar o sábado? [ ] Sim [ ] Não. Algum pregador já ameaçou você com maldições ou com a exclusão da igreja, por não entregar o dízimo? [ ] Sim [ ] Não.

O voto de Jacó

A segunda vez que o dízimo é mencionado é pelos lábios de Jacó, no episódio da visão da escada, quando fugia de seu irmão Esaú, indo para Padã-Arã. Leia devagarzinho o texto. Uma, duas ou mais vezes. Pese cada palavra que foi dita por Deus a Jacó. E cada palavra que Jacó disse a Deus. Deixe o texto falar ao seu entendimento: A terra em que agora estás deitado, eu ta darei, a ti, e à tua descendência. Deus falou. Agora, é Jacó falando: Se Deus for comigo, e me guardar nesta jornada que empreendo, e me der pão para comer e roupa que me vista, de maneira que eu volte em paz para a casa de meu pai, então o Senhor será o meu Deus; de tudo quanto me concederes, certamente eu te darei o dízimo [Gênesis 28]. E Deus foi com ele e o guardou e lhe deu mais que o pão para comer e roupa para vestir. Deu-lhe riqueza, como veremos adiante. Então, quando os seus descendentes recebessem a terra, ficariam obrigados e entregar o dízimo do que Deus lhes concedera. Se iam herdar a bênção prometida a seu pai, deveriam herdar também a obrigação contraída por ele naquele pacto; pois foi justamente a terra que Deus prometera dar a Jacó, que foi dada aos seus descendentes.

Quando li isso, caiu a ficha. Ah-ah, acho que aí está o segredo do dízimo! Fiquei convencido de que foi por causa desse voto espontâneo de Jacó, feito diante da promessa de Deus, que os seus descendentes ficaram obrigados a entregar a Jeová todas as dízimas da terra (de Canaã), tanto do grão do campo, como do fruto das árvores, do gado e do rebanho, quando entrassem na posse dessa terra prometida [Levítico 27].

Se você assinalou com o lápis vermelho todos os textos que falam na terra que seria dada a esse povo, já deve ter percebido que todo trato de Deus com Abraão, Isaque, Jacó e seus descendentes gira em torno dessa promessa. Ou seja, sempre envolvendo a posse da terra de Canaã. Continue lendo e marcando.

Agora, vou lhe contar um segredinho: li e reli o Velho Testamento, e o Novo Testamento também, com redobrada atenção, em busca da verdade, mas procurando especificamente uma coisa: pelo menos uma menção do dízimo em dinheiro. E nada encontrei. Nem tampouco a obrigação de um aguadeiro, carpinteiro, comerciante, copeiro, empregado, empresário, ferreiro, médico, padeiro, pedreiro, soldado, tecelão ou de qualquer outro profissional daqueles tempos de pagar/dar/entregar o dízimo do seu salário ou do seu rendimento. O dízimo somente incidia sobre os frutos ou produtos da terra da promessa, que os israelitas herdaram, ou seja, a terra de Canaã. E não pense que naqueles tempos idos não houvesse pagamentos em dinheiro de salários e indenizações. Havia sim. Veja estas menções em Êxodo 21 e Levítico 19.

Opa, parece que eu me contradisse! Lá em cima eu falei em dinheiro do dízimo, naquela pergunta importuna, não foi? Agora estou dizendo que não havia dízimo em dinheiro! Ah, mas eu explico. Que eu saiba, em duas ocasiões, o dízimo podia ser transformado em dinheiro.

Uma: Quando o dizimista quisesse resgatar alguma coisa. Ou seja, em vez de entregar a coisa dizimada, propriamente dita, ele a substituía por dinheiro. Nesse caso, havia uma pena: ele tinha de acrescentar 20% ao preço dela, isto é, um quinto do seu valor [Levítico 27]! Imagine o fato: O judeu — descendente de Jacó — recebeu a posse da terra prometida, plantou, colheu, separou o dízimo, mas quer ficar com uma dessas coisas do dízimo. Tudo bem, pode. O sacerdote avalia esse bem, o dizimista acrescenta 20% sobre o valor dele e entrega o dinheiro. É como se ele estivesse comprando a mesma coisa que ele tinha consagrado como dízimo, com um ágio de 20%, ou um quinto. Compreendeu? Não se tratava de dízimo do dinheiro recebido a título de salário ou lucro.

Duas: Quando ele estivesse longe do lugar que Jeová iria determinar para o culto e para a entrega dos dízimos e das ofertas, e fosse custoso transportar para lá o dízimo consistente em cereal, vinho, azeite, gado. Então o dizimista podia vender tudo (inclusive os primogênitos dos animais, que pertenciam a Jeová), e converter tudo isso em dinheiro, comparecer ao templo e lá comprar o que quisesse para substituir o que ele havia vendido [Deuteronômio 14]. Nesse caso, ele não tinha de acrescentar os 20%. Deu para notar que ele não entregava dízimo em dinheiro a ninguém?

Mas há muita gente perita em ajeitar as coisas e deixá-las do jeitinho que quer ou do jeitinho que lhe seja mais conveniente. Por exemplo. Sobre essa história de Jacó, não faz muito tempo, ouvi um pregador dizer que, na volta de Padã-Arã, Jacó pagou o dízimo a Esaú! Esse pregador conseguiu tirar essa mirabolante idéia do fato de Jacó, ameaçado de morte e tremendo de medo, ter dado um baita presente a Esaú, para aplacar o ódio desse seu irmão, a quem ele enganara usurpando-lhe a bênção da primogenitura [Gênesis 27, 32].

Leia com atenção o recado que Jacó mandou a Esaú:

Assim falareis a meu senhor Esaú: Teu servo Jacó manda dizer isto: ... Tenho bois, jumentos, rebanhos, servos e servas; mando comunicá-lo a meu senhor, para lograr mercê à sua presença. ...Então Jacó teve medo e se perturbou; ...E orou Jacó: Deus de meu pai Abraão, e Deus de meu pai Isaque... Livra-me das mãos de meu irmão Esaú, porque o temo... E, tendo passado ali aquela noite, separou do que tinha um presente para seu irmão Esaú: duzentas cabras e vinte bodes; duzentas ovelhas e vinte carneiros; trinta camelas de leite com suas crias; quarenta vacas e dez touros; vinte jumentas e dez jumentinhos.

Calculou o tamanho do presentão que Esaú recebeu? Eu somei e encontrei 580 cabeças de animais. Em vinte anos como fazendeiro, eu não consegui juntar nem a metade disso!

Seria muito se eu lhe pedisse para refletir nesse relato e responder com toda sinceridade a mais uma perguntinha? Você consegue ver aí um dizimista entregando, dando ou pagando o dízimo? [ ] Sim [ ] Não

O mandamento do dízimo

Acredito que ficou claro que a primeira menção bíblica ao dízimo foi aquela relacionada a Abraão; e a segunda, aquela relacionada ao voto de Jacó. Mas o primeiro mandamento bíblico do dízimo — que a rigor nem pode ser chamado de mandamento — só aparece em Levítico 27. Preste atenção nisto: quando eu digo que não pode ser chamado de mandamento, é porque Moisés está simplesmente comunicando um fato ao povo, nestes termos: Também todas as dízimas da terra (não se esqueça leitor, terra aqui se refere à terra de Canaã), tanto do grão do campo, como do fruto das árvores, são do Senhor: santas são ao Senhor. ...No tocante às dízimas do gado e do rebanho, de tudo o que passar debaixo da vara do pastor, o dízimo será santo ao Senhor. É como se Moisés estivesse dizendo: O Senhor vai lhes dar a posse da terra de Canaã, mas as dízimas, não! Estas pertencem a ele! E em seguida, o livro de Levítico é encerrado com estas solenes palavras: São estes os mandamentos que o Senhor ordenou a Moisés, para os filhos de Israel, no monte Sinai. (Para os filhos de Israel, e não para a Igreja, viu?). Como diria um ex-árbitro e hoje comentarista de futebol: A regra é clara!

Tudo o que vem depois, relacionado ao dízimo, são as instruções do que fazer com ele: Quando dizimar, o quê dizimar, onde entregar e comer o dízimo, quem pode ou não pode comê-lo, como distribuí-lo.

Agora vamos raciocinar: Se esse mandamento do dízimo no capítulo 27 de Levítico é também para a Igreja, parece-me lógico concluir que tudo que foi ordenado nos capítulos anteriores também deve ser. Há pregadores que doutrinam seus seguidores a não comerem certos animais, porque são imundos ou impuros (os animais, não os seguidores!), com base nos preceitos do capítulo 11; mas nada ensinam sobre a purificação da mulher após o parto, como está disciplinado no capítulo 12. Todavia esse ritual de purificação estava também em vigência nos dias do Senhor Jesus, tanto que sua mãe, Maria, o praticou [Lucas 2]. E nadica de nada ensinam sobre o trato com a lepra e o leproso, que é ordenado nos capítulos 13 e 14. Também esse preceito estava em vigor nos dias do Senhor Jesus; tanto que após curar um leproso, mandava que ele fosse mostrar-se ao sacerdote e fazer a oferta que Moisés ordenara, para servir de testemunho ao povo [Mateus 8; Marcos 1; Lucas 5, 17]. E lepra e leproso existem até hoje, em menor escala, é bem verdade. Observou? Tira-se um ensino do capítulo 11, pulam-se os demais capítulos e lança-se mão do capítulo 27. Ou então, tira-se um ensino do capítulo 27, e desprezam-se os demais. Por que será? Será porque o dízimo traz vantagens pecuniárias imediatas para o próprio pregador?

A próxima menção ao dízimo está em Números 18, e tem também apenas caráter comunicante. Veja:

Aos filhos de Levi dei todos os dízimos em Israel por herança, pelo serviço que prestam, serviço da tenda da congregação. (Em Israel, e não na Igreja, viu?). E nunca mais os filhos de Israel se chegarão à tenda da congregação, para que não levem sobre si o pecado e morram. Mas os levitas farão o serviço da tenda da congregação, e responderão por suas faltas: estatuto perpétuo é este para todas as vossas gerações. Porque os dízimos dos filhos de Israel, que apresentam ao Senhor em oferta, dei-os por herança aos levitas; porquanto eu lhes disse: No meio dos filhos de Israel nenhuma herança terão.

No próximo item, vamos descobrir porque os filhos de Levi (os levitas) foram escolhidos, e descobrir também porque o dízimo foi dado a eles.

Os Levitas

Por que Deus escolheu os levitas? Antes de buscar a resposta, esclareço: Levitas eram os descendentes de Levi, terceiro filho de Jacó e Lia. Nessa busca vislumbrei três possíveis respostas. Uma. Foi puramente por sua vontade e soberania. Afinal, como Senhor de tudo e de todos, ele escolhe quem ele quer. Duas. Foi uma homenagem prestada aos ousados levitas, Moisés e Arão, que enfrentaram a corte e os deuses egípcios [Êxodo 5, 12], para libertar o povo hebreu. Três. Foi porque os levitas eram bons de briga [Gênesis 34; Êxodo 32], e ganharam esse privilégio no fio da espada. Fico com essa última.

Vamos aos fatos. O povo estava no sopé do fumegante monte Sinai, e Moisés, lá em cima. Demorando Moisés a descer, aquele povo ficou desvalido, confuso, indefeso e temeroso — como crianças abandonadas no meio do nada —, desesperou-se e resolveu fazer um deusinho para si, que pudesse socorrê-lo em caso de perigo. (Não vemos por aí, em pleno século vinte e um, todo dia, gente muito religiosa, muito evangelizada, mas sem o conhecimento da plena verdade evangélica, se agarrando também a uma imagem, a um crucifixo, a um rosário, a uma medalhinha, a um pé de coelho, a um ramo de arruda, a um pouco de terra do Sinai, ao sal grosso, à água do Jordão, a uma rosa branca ou amarela, ou a um manto, para socorrê-la na hora do perigo?). Pegaram então o ouro das orelhas das mulheres, dos filhos (desde aquele tempo os rapazes já gostavam de usar brinquinho), e das filhas, entregaram a Arão e ele fez um bezerro. No dia seguinte, o povo madrugou para o culto, assentou-se para comer e beber, e se levantou para se divertir — e de tamborins na mão, tocou a dançar. Moisés ficou sabendo e desceu depressa com as duas tábuas do testemunho, ou seja, com os dez mandamentos, que Deus acabara de escrever com o seu dedo. E seu secretário particular, Josué, disse para ele: Há alarido de guerra no arraial. E Moisés replicou: Que nada, é alarido de festa. E quando viu aquele deusinho de ouro, ficou possuído de ira santa e arrojou das mãos as tábuas e quebrou-as ao pé do monte.

Em seguida, vendo Moisés a orgia e a perversão daquele povo, gritou: Quem é do Senhor venha até mim. Então se ajuntaram a ele todos os filhos de Levi. E Moisés concitou-os: Consagrai-vos hoje ao Senhor: cada um contra o seu filho, e contra o seu irmão; para que ele vos conceda hoje uma bênção. Então os levitas mataram do povo naquele dia uns três mil homens, e conseguiram a bênção prometida por Moisés [Êxodo 32]. Que bênção seria essa?

Vamos à escolha. (Agora, já faz mais de um ano que Israel saiu do Egito). Eis que tenho tomado os levitas do meio dos filhos de Israel, em lugar de todo primogênito, que abre a madre, entre os filhos de Israel: e os levitas serão meus [Números 3]. E Deus fez uma permuta com Israel: deu os primogênitos, que ele havia consagrado a si (22.273) [Êxodo 13] em troca dos levitas (22.000). E como havia mais primogênitos do que levitas, os israelitas tiveram que dar o troco em dinheiro. Feitos os cálculos, pagaram 1.365 siclos [Números 3]. Os levitas ganharam essa bênção, mas perderam outra: não receberiam herança na terra de Canaã; a sua herança seria o Senhor [Deuteronômio 18]. Mas em compensação receberiam os dízimos das lavouras e do gado do restante do povo [Números 18]. E como era muito dízimo, podia ser distribuído aos órfãos, às viúvas e até aos estrangeiros, pelos próprios dizimistas, como veremos nos itens seguintes.
Um esclarecimento. Se os levitas não iam receber herança na terra de Canaã, onde morariam?
Bem, seriam destinadas a eles quarenta e oito cidades, das quais 6 seriam cidades de refúgio, para acolhimento do homicida que matasse alguém involuntariamente [Números 34]. As demais tribos teriam que lhes fazer essa doação, proporcional ao número de cidades que tocasse a cada uma delas. Além disso, os arredores dessas cidades, de mil côvados ao redor, seriam para o gado, para os rebanhos e para todos os animais dos levitas. Isso significava que os levitas tinham ao redor de cada cidade uma grande área de terra para o gado, para os rebanhos e para todos os seus animais [Números 35].

Não faz muito tempo, surgiu uma onda, que invadiu os arraiais evangélicos; não tão avassaladora quanto a tsunami, mas que poderia se tornar bastante ameaçadora. Refiro-me à onda dos levitas. Levita pra cá, levita pra lá; e parece que com o apoio de muitos pastores. E eu fiquei na minha, esperando para ver em que isso ia dar. Até uma de minhas filhas chegou a me dizer que era levita. Devia estar levitando! Expliquei-lhe que isso não era possível, e mostrei-lhe na Bíblia, que essa pretensão era inadmissível. Primeiro, porque ela não descendia de Levi. O ofício atribuído aos levitas era exclusivo deles. Segundo, porque, mesmo que ela fosse descendente de Levi, não cabia às mulheres exercerem o ofício atribuído aos levitas. Terceiro, porque na Igreja do Senhor Jesus não existe lugar para o ofício atribuído aos levitas. De fato, no concerto do Sinai, a proposta de Deus era de que Israel seria um reino de sacerdotes [Êxodo 19]. Mas por causa da prevaricação do povo no episódio do bezerro de ouro, enquanto os Levitas ganhavam uma bênção, Israel perdeu a sua, e nunca mais os filhos de Israel chegariam à tenda da congregação. Isso se tornara agora obrigação e privilégio exclusivo dos levitas, e somente para os do sexo masculino [Números 1, 3, 18]. Ora, se os dízimos eram dos levitas... então os levitas é que deveriam receber os dízimos. Logo, logo encontrei alguma coisa na Internet nesse sentido. Havia levitas começando a reivindicar os seus direitos. Ultimamente, parece que a onda se arrefeceu. Não é muito conveniente para o clero essa história de levitas modernos reivindicarem os dízimos. E é bom que se saiba que os levitas não somente serviam no templo como ajudantes dos sacerdotes, e no tempo do rei Salomão, como cantores, mas também serviram como guardas, no reinado de Joás. E não era de brincadeira não. Veja essas instruções que lhes foram dadas pelo sacerdote Joiada: Esta é a obra que haveis de fazer: uma terça parte de vós sacerdotes e levitas, que entrais no sábado, servirá de guardas da porta;... Porém ninguém entre na casa do Senhor, senão os sacerdotes e os levitas que ministram; mas todo o povo guardará o preceito do senhor. Os levitas rodearão o rei, cada um de armas na mão, e qualquer que entrar na casa, seja morto; estareis com o rei quando entrar e quando sair [II Crônicas 23].

Hoje não precisamos mais de levitas. Estão dispensados. O seu ofício cessou. O véu do templo se rasgou de alto a baixo [Mateus 27], e cada crente pode chegar agora com confiança junto ao trono da graça, a fim de receber misericórdia e achar graça para socorro em ocasião oportuna [Hebreus 4], pois somos raça eleita, sacerdócio real, nação santa, povo de propriedade exclusiva de Deus... , como nos assegura o apóstolo Pedro [I Pedro 2].

Ora, se o dízimo foi dado aos levitas, e a Igreja não tem levitas, não há nem mais a quem entregar os 2% que lhes tocariam. Qualquer outra explicação que se dê a isso é balela, arranjo, invencionice. Não tem fundamento bíblico, e, portanto, não tem valor!

Quando, o quê, onde, quem, como?

Pedi que você marcasse os textos bíblicos que contivessem a expressão: Quando o Senhor teu Deus te introduzir na terra... e outras equivalentes. Se você o fez, deve ter notado a quantidade de vezes que isso é repetido, especialmente em Deuteronômio. Se olharmos do ponto de vista jurídico, Deuteronômio pode ser considerado como a regulamentação da lei; ou, como diz o próprio livro, a explicação da lei [capítulo 1º]. Para facilitar a leitura e a compreensão, algumas edições da Bíblia dividem esse livro em quatro discursos. Se a sua Bíblia é dessas, você vai encontrar Arremedando aqui um bom repórter, vamos lançar mão dessas clássicas e práticas perguntas jornalísticas e fazer nossa reportagem sobre o dízimo, procurando respondê-las uma a uma.

No item sobre a ordenança do dízimo, eu disse que tudo o que vinha depois eram as instruções do que fazer com ele: quando dizimar, o quê dizimar, onde entregar e comer o dízimo, quem podia ou não comê-lo, como distribuí-lo.

Quando?

O primeiro discurso de Moisés nos capítulos 1º ao 4º; o segundo discurso, nos capítulos 4º ao 26; o terceiro discurso nos capítulos 27 e 28; e o quarto discurso, nos capítulos 29 a 33. No primeiro discurso, Moisés conta a história de Israel, porque muitos daquela geração saíram crianças do Egito, outros nasceram no deserto e não sabiam de muitos fatos que haviam acontecido. No segundo discurso, Moisés conta a história da legislação, repetindo os dez mandamentos e outras leis, e explica como deveriam ser observados. No terceiro discurso, Moisés e os anciãos deram ordem ao povo para guardar os mandamentos quando passassem o Jordão, sob pena de ficarem sujeitos às maldições, solenemente proclamadas no monte Ebal. Já no quarto discurso, Deus faz nova aliança com o povo, além da que fizera no monte Horebe (Sinai). Era exatamente quando entrassem na terra (o que ia acontecer em breve), que deveriam observar os preceitos, entre os quais estavam os relativos ao dízimo: São estes os estatutos e os juízos que cuidareis de cumprir na terra que vos deu o Senhor, Deus de vossos pais, para a possuirdes todos os dias que viverdes sobre a terra [Deuteronômio 12]. Essa condição é repetida dezenas de vezes no Deuteronômio.

O quê?

O quê os israelitas deveriam dizimar? A gleba de terra que cada família de sem terras recebesse não seria dizimada. Essa família não ia pegar um pedaço da terra recebida e entregar a quem devesse receber o dízimo: levitas, estrangeiro, órfãos e viúvas. Não encontrei nenhuma instrução sobre dizimar qualquer coisa que não fosse o fruto da terra e o rebanho. Como eu disse no item O Voto de Jacó, eu não encontrei nem no Velho Testamento nem no Novo nenhuma menção a dízimo de salários ou de outra fonte, que não fosse do fruto da terra (da terra de Canaã, bem entendido!) e do rebanho, que era criado sobre ela. Só há uma exceção. Os levitas deviam entregar aos sacerdotes (também descendentes de Levi) os dízimos dos dízimos que recebessem dos israelitas. O preceito é claro: Também todas as dízimas da terra (não se esqueça leitor — terra aqui se refere à terra de Canaã), tanto do grão do campo, como do fruto das árvores, são do Senhor: santas são ao Senhor. ...No tocante às dízimas do gado e do rebanho, de tudo o que passar debaixo da vara do pastor, o dízimo será santo ao Senhor [Levítico 27]. Não encontrei também a obrigação de dizimar imposta a quem não fosse detentor da posse da terra. Haja vista que o estrangeiro, que certamente trabalhava e tinha seus rendimentos, não estava sujeito a dizimar nada. Muito pelo contrário, era beneficiado pelo dízimo, pois o dizimista tinha a obrigação de lhe entregar parte do dízimo consagrado a Deus.

Onde?

Dentre os diversos preceitos relativos ao dízimo, havia aquele que determinava onde o dizimista deveria entregá-lo e comê-lo. Isso ficou expressamente esclarecido: Mas buscareis o lugar que o Senhor vosso Deus escolher de todas as vossas tribos, para lá pôr o seu nome, e sua habitação; e para lá ireis. A esse lugar fareis chegar os vossos... dízimos; Nas tuas cidades não poderás comer o dízimo do teu cereal, nem do teu vinho, nem do teu azeite...; Certamente darás os dízimos de todo o fruto das tuas sementes, que ano após ano se recolher do campo. E, perante o Senhor teu Deus, no lugar que escolher para ali fazer habitar o seu nome, comerás os dízimos do teu cereal, do teu vinho e do teu azeite, e os primogênitos das tuas vacas e das tuas ovelhas; para que aprendas a temer ao Senhor teu Deus todos os dias. [Deuteronômio 12, 14]. Essas expressões são muito fortes: darás os dízimos... comerás os dízimos... para que aprendas a temer ao Senhor teu Deus... Veja que os levitas, o estrangeiro, o órfão e a viúva — beneficiários dos dízimos — podiam comê-los em qualquer lugar [Deuteronômio 26].

Tudo isso contraria o que o autor do texto lá de cima disse, e certamente o que muitos pregadores ensinam, inclusive o Autor do livrinho mencionado no Prefácio. Vemos, pois, que o dizimista não somente podia comer o dízimo e administrá-lo, mas tinha de fazê-lo. Ou seja, tinha de comê-lo e tinha a obrigação de administrá-lo também.

Quando sugeri que marcasse as frases que se referissem à terra de Canaã, é porque percebi na releitura que fizera da Bíblia, que o dízimo está intimamente vinculado à posse da terra. Os judeus somente estariam obrigados a dizimar, quando tivessem a posse da terra, e somente do fruto da terra, incluindo o rebanho. Na sua caminhada de quarenta anos pelo deserto, nada lhe foi exigido; mas quando entrasse na terra... Veja todas as referências que você marcou de vermelho e azul.

Quero lhe indicar um texto bem lá na frente, Neemias 10, muito esclarecedor do que acabo de afirmar: ...os dízimos da nossa terra aos levitas, pois a eles cumpre receber os dízimos em todas as cidades onde há lavoura.

Quem?

No capítulo 26, descobrimos que esse quem envolvia o dizimista e os que deveriam receber os dízimos: os levitas, o estrangeiro, os órfãos e as viúvas. Esses últimos, como já disse, estavam autorizados a comer o dízimo em todo lugar, e sem a necessidade de praticar o cerimonial de se purificar. O dizimista, não; somente podia comer o dízimo estando puro e no lugar predeterminado por Deus. [Números 18, Deuteronômio 26].

Uma perguntinha pertinente, mas perturbadora: Alguma vez você foi instruído a comer o dízimo, ou a distribuí-lo com o estrangeiro, com os órfãos ou com as viúvas, como está ordenado na Bíblia ao dizimista fazer? Se não, você está sendo enganado! Mostraram-lhe Malaquias 3, mas esconderam Deuteronômio 14 e 26. Ora, se em relação ao dízimo, Malaquias 3 é aplicável à Igreja, penso que Deuteronômio 14 e 26 também devem ser. Você não acha meu caro dizimista?


Como?

Ao dizimista competia levar o dízimo ao lugar escolhido por Deus, comê-lo e distribuí-lo. Mas como fazer? Para levar uma grande quantidade e a lugar distante, podia vendê-lo, transformando-o em dinheiro, e depois comprar outras coisas para pôr no lugar das que vendera. Isso também está disciplinado nos capítulos 14 e 26 de Deuteronômio.

Viu? Comer o dízimo não era nenhum ato de profanação de coisa sagrada, como alguns pregadores andam dizendo (e escrevendo) por aí. Muito pelo contrário. Era ato de estrita obediência ao preceito de Deus! Bom, aqui fica claro que ele podia e tinha de comer. Mas poderia administrá-lo? Vou transcrever mais um texto:

Quando acabares de separar todos os dízimos da tua messe no ano terceiro, que é o dos dízimos, então os darás ao levita, ao estrangeiro, ao órfão e à viúva, para que comam dentro das tuas cidades, e se fartem [Deuteronômio 26].

Viu? Nesse ano, o terceiro, o próprio dizimista distribuía o dízimo do que ele havia colhido, dando-o ao levita, ao estrangeiro, ao órfão e à viúva, nas cidades deles. Apenas a parte que tocara ao dizimista era levada ao lugar que Deus escolhera. A outra parte (80%) era distribuída pelo dizimista. Ele estava administrando, em obediência ao preceito de Deus.

Veja e compare o grau de sagração do dízimo e da páscoa. Observe que até o estrangeiro, não descendente de Jacó, tinha o direito de comer o dízimo, em qualquer lugar. Mas se quisesse comer a páscoa, tinha de observar primeiramente o ritual da circuncisão, pois do contrário não podia comê-la [Êxodo 12].
No tempo presente, já ouviu alguma vez o dizimista ser orientado a comer o dízimo? Eu sei que surgirão muitas explicações. Dirão alguns cobradores de dízimo: Na atualidade, o dizimista entrega o dízimo em dinheiro na igreja e se alimenta da palavra. Espiritualiza-se. Mas não é assim que está escrito. Na Bíblia, o dizimista comia literalmente o dízimo, digeria o dízimo comido e, desculpe a franqueza, defecava o dízimo que comera e digerira! Não se tratava de palavras ou de ensinamentos recebidos. Era comida mesmo: produtos da terra e animais! Como diríamos hoje: arroz, feijão e carne!

Havia uma restrição: o dizimista não podia comer o dízimo em casa, somente no lugar determinado por Deus, ou seja, no templo, no lugar de adoração [Deuteronômio 12]. O levita, o estrangeiro, o órfão e a viúva podiam comê-lo na sua cidade [Deuteronômio 26]. Sabe por que o dizimista não podia comer o dízimo em casa ou em sua cidade, ou em outro lugar que não no templo? Porque o seu dízimo fazia parte do culto, e o culto doméstico era proibido, para não haver confusão com o culto prestado aos deuses dos pagãos, tão abundantes naqueles tempos [Deuteronômio 12].

Bom, os levitas foram dados aos sacerdotes, para servi-los [Números 3, I Samuel 2, I Crônicas 23]. Os sacerdotes não recebiam dízimos diretamente do dizimista. Recebiam o dízimo dos dízimos dos levitas. Não do estrangeiro, nem dos órfãos, nem das viúvas, pois esses não tinham obrigação de dizimar [Números 18, Neemias 10].

Dizimista Fiel

No item Duas Curiosidades Sobre o Dízimo, o bispo ali mencionado exigiu urgentes providências de Deus, alegando ser um dizimista fiel. Cabe aqui uma pergunta: O que é ser um dizimista fiel? Em que consiste isso?

Há empresas comerciais que fazem promoções dos seus produtos, vendidos para serem pagos em prestações mensais, prometendo um brinde para o comprador que efetuar o pagamento no prazo do vencimento de cada prestação. Outras prometem que se o prestamista efetuar o pagamento no prazo, concorrerá ao sorteio de um automóvel ou de uma casa. Ela se empenha para fazer prestamistas fiéis. Podemos entender, então, que prestamista fiel é o que paga em dia suas prestações. E o dizimista fiel, o que ele deve fazer para merecer esse epíteto?

Ora, vimos que Deus estabeleceu todos os deveres de um dizimista. Parece-me lógico concluir que dizimista fiel é aquele que cumpre todas as condições estabelecidas por Deus, como acabamos de ver acima. Mas confeccionar uma fitinha ou pulseira e trazê-la no braço — ao modo dos devotos do Senhor do Bonfim — e nela inscrever: Ó, Deus! Não se esqueça que eu sou dizimista fiel, não faz de nenhuma pessoa um dizimista fiel. Deus não mandou pôr fitinha nem pulseira no braço, para lembrá-lo de qualquer coisa! Deus não tem memória curta. O homem, sim, é que precisa de lembretes, para não se esquecer dos mandamentos de Deus. Tanto que Deus ordenou aos hebreus, que usassem franjas ou borlas nos cantos das suas vestes, amarradas com fita azul, para que, vos lembreis de todos os mandamentos do Senhor, e os cumprais; e não seguireis os desejos do vosso coração, nem o dos vossos olhos, após os quais andais adulterando [Números 15, Deuteronômio 22]. Alguma vez você foi instruído a usar franjas ou borlas nos cantos das vestes, amarradas com fita azul, para se lembrar dos mandamentos de Deus? Dá para perceber como os pregadores gostam de inventar coisas? Deus não mandou usar fitinha para lembrá-lo de alguma coisa, mas o pregador usa. Deus mandou usar franjas ou borlas na roupa, para o homem se lembrar dos mandamentos dele, mas o pregador não usa! Nem as promoções que são feitas em certas igrejas, de chamar os dizimistas fiéis à plataforma para receberem honrarias e uma oração especial; nem um certificado que lhe seja concedido, podem substituir o que Deus determinou que fosse feito. O que ele mandou a respeito do dízimo está expresso com clareza e muito bem detalhado nos textos bíblicos já citados. Não consta que ele tenha delegado poderes para alguém modificar suas instruções, reescrever a Bíblia e estabelecer novas regras. Os fariseus e os escribas é que costumavam modificar os preceitos de Deus, substituindo-os pelas suas tradições. E por causa disso, foram severamente repreendidos pelo Senhor Jesus [Mateus 15, Marcos 7]. Está escrito, e as regras do dízimo eram claras. Cabia aos judeus observá-las, como lhes fora determinado. E... zé fini!

O bispo acima referido se diz um dizimista fiel. Mas posso garantir que, à luz dos preceitos bíblicos, ele nunca foi, não é e nunca será um dizimista fiel. Ele não tem como satisfazer todas as condições e regras estabelecidas por Deus e claramente expressas na Bíblia. Ele pode até ser um ofertante generoso, um louvável contribuinte com dez por cento, vinte por cento, até com noventa por cento de toda a sua renda, ou com tudo! Mas nunca um dizimista bíblico, pois o dízimo ensinado nas igrejas não é o dízimo bíblico e nem se parece com ele!

O dizimista bíblico era um judeu que recebera uma herança na terra de Canaã. E dessa terra, tinha de separar todas as dízimas, tanto do grão do campo, como do fruto das árvores, do gado e do rebanho. Tinha de levar o dízimo ao lugar determinado por Deus e lá comer esse dízimo estando puro. No terceiro ano, tinha de distribuí-lo com o levita, o estrangeiro, o órfão e a viúva. Ao fazer essa entrega, tinha de recitar uma oração específica. Não podia dar do dízimo para a casa de nenhum morto, e nem dele comer estando impuro. E isso em nada se parece com o dízimo ensinado nas igrejas hoje. Qualquer outra prática diferente dessas estabelecidas por Deus é criação ou pura invencionice do homem. A lagartixa se parece muito com um filhote de jacaré, mas nunca chegará a tal. Lagartixa é lagartixa, jacaré é jacaré. O dízimo bíblico é o dízimo ordenado por Deus; o dízimo praticado nas igrejas é o dízimo criado e imposto pelo homem! Não estou dizendo que ele é bom nem que é ruim; se está certo ou se está errado; se traz bênção ou não. Estou afirmando que não é o dízimo exigido por Deus. Não é o dízimo mencionado por Malaquias.

A partilha do dízimo

Agora, acompanhe-me num raciocínio curioso, que chega a ser intrigante. Considerando que o dizimista tinha de comer o dízimo ou do dízimo; e levando em conta que tinha a obrigação de distribuí-lo com o levita, o estrangeiro, o órfão e a viúva, inventei de fazer um cálculo e achei este resultado:

O dizimista ficaria com 1/5 do dízimo, ou seja, 2% do bem dizimado
O levita, com 1/5 do dízimo, ou seja, .............. 2% do bem dizimado
O estrangeiro, com 1/5 do dízimo, ou seja, ..... 2% do bem dizimado
O órfão, com 1/5 do dízimo, ou seja, .............. 2% do bem dizimado
A viúva, com 1/5 do dízimo, ou seja ............... 2% do bem dizimado

Total .................................................. 10% do bem dizimado

Ora, o levita tinha de entregar o dízimo dos seus 2% ao sacerdote. Então o sacerdote recebia, na realidade, somente 0,2%.

Quando cheguei a esse resultado, confesso que pensei que fosse desvario meu. Teria algum fundamento tal cálculo, ou o sol da fazenda estava me cozinhando os miolos? Passou-se um tempo, coisa de um mês ou mais, e eu continuava lendo. Aí, heureca! Estava lá na minha Bíblia e eu não tinha visto ainda. Espero que esteja na sua também. Vamos lá? Em Números 31, está um fato esclarecedor disso. E de acordo com o texto, foi o próprio Deus quem mandou fazer isto: ...de cada quinhentas cabeças uma, ...e o dareis ao sacerdote Eleazar, para a oferta do Senhor. ...tomarás de cada cinqüenta um ,...e o darás aos levitas...

Sabe quanto é, em percentual, um de quinhentos, que foi dado ao sacerdote? É 0,2%! Sabe quanto é, em percentual, um de cinqüenta, que foi dado aos levitas? É 2,0%!

Aí, descobri que os meus miolos não estavam cozidos e eu não estava ficando maluco. O tal cálculo curioso estava confirmado.

O Gazofilácio

Sabe o que era? Era uma caixa de madeira com um buraco na tampa, posta à mão direita de quem entrava na casa do Senhor, onde se lançavam ofertas em dinheiro. Não foi ordenada por Moisés. É uma invenção do rei Joás com o sacerdote Joiada [II Reis 12, II Crônicas 24]. No tempo do Senhor Jesus, havia uma à entrada do templo também [Lucas 21, João 8].

Pois bem, como esteve em voga dar uma espiadinha, andei bisbilhotando e dei uma olhadinha no que havia nessa caixa, nos dias do rei Joás. Não encontrei nenhum envelopezinho de dízimo com o indefectível Malaquias 3! Também, pudera! Não seria possível pôr nela o cereal, nem o vinho, nem o azeite. Muito menos gado. Dê uma espiadinha também, conferindo as referências acima.

Percebeu como uma leitura feita com atenção traz luz e conhecimento? Até onde nada se fala sobre o dízimo, você pode aprender a verdade sobre ele. Na relação das ofertas, que seriam lançadas no gazofilácio, não consta o dízimo, apenas a taxa pessoal ou imposto, o regate de pessoas [Êxodo 30] e de primogênitos de animais imundos, a quinta parte (20%) dada em resgate de alguma coisa [Levítico 27], e ofertas voluntárias. Hoje, constaria no topo da lista com certeza.

E por falar em leitura feita com atenção, lembrei-me de um episódio, que ilustra muito bem essa circunstância. Perguntei a alguns leitores da Bíblia recentemente: Você sabe como se chamava o pai do apóstolo Pedro? Ninguém atinou com a resposta. E você, leitor, sabe? Se não souber, é porque não leu com atenção os evangelhos. Porque essa informação foi repetida pelo menos três vezes. E se você não sabe como se chamava o pai de Pedro, certamente nunca saberá dizer como se chamava a mãe de Tiago e João!

A síndrome de Malaquias

Minha esposa e eu ouvimos a notícia pelo rádio do carro. Anunciaram que um missionário norte-americano estaria pregando em Brasília e ia fazer milagres. Como os milagres estão muito raros ultimamente, fomos conferir. De começo, vimos uma mulher tentando fazer um milagre: ela precisava levantar vinte mil reais para pagar o som. E começou o leilão: Quem vai ofertar R$ 100,00? Não me lembro de ter visto nenhuma mão levantada. Quem vai dar R$ 50,00? Parece que vi algumas. R$ 20,00?, R$ 10,00?, R$ 5,00? À medida que ela ia abaixando os lances, crescia o número de mãos levantadas. Um real? Ela deve ter achado que não valia a pena: nem pediu. Nos meus cálculos, somando aquelas mãos levantadas, o milagre dos vinte mil não aconteceu. Chegou agora a vez do missionário pregador. Ele leu em Atos 10, sobre a conversão de Cornélio. Gosto muito desse texto. Pensei: vai sair uma boa mensagem daí. Ele começou re-traduzindo a Bíblia. Lá, onde diz que Cornélio fazia muitas esmolas ao povo, o missionário disse que a tradução correta era: Cornélio dava muitas ofertas a Deus. Ai! Chiei. Ele vai tentar fazer o milagre que a mulher não conseguiu. Dito e feito! E de repente, manifestou-se nele a síndrome de Malaquias: Roubará o homem a Deus... vós me roubais...Trazei todos os dízimos à casa do tesouro, para que haja mantimento na minha casa... Mas como trazer os dízimos à casa do tesouro? Nós estávamos num mundano estádio de futebol e não no sagrado templo em Jerusalém, que já nem existe mais! E, lá pelas tantas, ele sapecou essa: A única maneira de abrirmos as janelas do céu é pagando o dízimo. Blá, blá, blá... e adiou os milagres para a noite seguinte. Perdemos o nosso tempo e a esperança de ver os milagres anunciados. Achamos que não valia a pena voltar na noite seguinte.

Mas apesar de tudo, na minha cabeça os pensamentos ficaram a mil por hora! Será que o que esse missionário disse tem fundamento? O dízimo tem esse poder quase mágico de abrir as janelas dos céus? É o abre-te sésamo, da história de Ali Babá e os quarenta ladrões? Mas a resposta sempre me vem; e ela não demorou muito. Lembrei-me de consultar quem entende de céu: Aquele que de lá desceu! Nem foi preciso ele me mandar um anjo mensageiro: a resposta estava no Livro. Fui lá e achei. Depois eu conto. Não tenha pressa, vamos chegar lá.

Repito: Era apenas o engano cavalgando a verdade.

Estou acometido de um mau hábito. Quando eventualmente me animo a ir a uma igreja, vou logo bisbilhotar o porta-envelopes. E quase sempre encontro o que procuro logo na entrada: a síndrome de Malaquias. Está impresso no envelopezinho, se não o texto pelo menos a referência: Malaquias 3. Por que não arranjam uma coisa melhor, no Novo Testamento, por exemplo? Garanto que tem: Cada um contribua segundo tiver proposto no coração, não com tristeza ou por necessidade; porque Deus ama a quem dá com alegria (II Coríntios 9). Mas aí, com o garrote frouxo, a proposta baixa, o coração pequeno e sem as maldições, a oferta sai mixuruca e o gazofilácio não se enche! É melhor garantir os dez por cento e mais algumas ofertas: alçada, aniversário, caixa de assistência, compra do som, construção do suntuoso templo, compra do título de nobreza, gratidão, primícias, propósito, missionária, viagem a Israel, voluntária etc. E lá vem Malaquias 3!

Mas, a essa altura, você me pergunta: E aí, seu sabe tudo, como se vai financiar a obra? Eu me animo a responder: Comece cortando o supérfluo na sua igreja. Comece dando fim naquelas enormes caixas de som e aparelhagem estridentes, que massacram os ouvidos dos mais velhos e também dos mais novos e incomodam os vizinhos. (Ouvi sobre um qüiproquó numa igreja do interior de Goiás, onde um menino de doze anos teve os tímpanos estourados. Atribuiu-se esse dano ao excesso de barulho instrumental. Virou caso de polícia). Apaguem as luzes coloridas, que mais parecem luzes de boate ou show de rock. Economize no carro de luxo do pastor — ele precisa aprender a viver modestamente, afinal, ele tem de ser o exemplo dos fiéis, e não precisa de carro importado, nem de mansão em Miami. Não invista na construção de templos suntuosos, catedrais, muito menos na construção de palácios, que está virando moda agora, porquanto Deus não habita em casa feita por mãos humanas. (Aliás, você sabe qual é o atual endereço de Deus, ou onde ele se propôs morar? [João 14]). Usem de maneira mais racional os templos. Quando você tiver tempo, dê um balanço e conte o tempo que os milhares de templos ficam abertos e o tempo que ficam ociosamente fechados, por esse Brasil afora! (Acho que exagerei em templos e tempos!). O povo já está muito oprimido pela escorchante carga tributária imposta pelo governo; está financeiramente apertado; a situação não está favorável — até parece que já estamos vivendo a grande tribulação! Pode-se aprender também com a Congregação Cristã no Brasil, que não cobra dízimo, mas marca presença em todo o território nacional, apesar de não ter ministério formal, institutos bíblicos, seminários, nem lançar mão da mídia; ou mesmo com a Assembléia de Deus, que se esparramou pelo Brasil afora com os esforços e os parcos recursos de crentes pobres e de pouca ilustração, superando em número as denominações antigas de gente rica e culta.

Isso aí em cima é só uma medida paliativa. A força que deve mover a obra não está no poder do dinheiro, mas no poder do Espírito Santo. O dinheiro deve ser apenas coadjuvante. E quando realmente ele se fizer necessário, o Espírito Santo moverá o povo de Deus e as ofertas virão com abundância. De puxar de rodo! Quer ver alguns exemplos disso? Ei-los:

O primeiro está no Velho Testamento [Êxodo 25, 36]. Vou transcrever os textos:

Disse o Senhor a Moisés: Fala aos filhos de Israel que me tragam oferta; de todo homem cujo coração o mover para isso (grifei), dele recebereis a minha oferta.

Esta é a oferta que dele recebereis: ouro, prata e bronze, e estofo azul e púrpura e carmesim, e linho fino, e pelos de cabra, e peles de carneiros tintas de vermelho, e peles de animais marinhos, e madeira de acácia, azeite para luz, especiarias para o óleo de unção, e para o incenso aromático, pedras de ônix, e pedras de engaste, para a estola sacerdotal e para o peitoral.

... e disseram a Moisés: O povo traz muito mais do que é necessário para o serviço da obra, que o Senhor ordenou se fizesse. Então ordenou Moisés — e a ordem foi proclamada no arraial, dizendo: Nenhum homem, nem mulher, faça mais obra alguma para a oferta do santuário. Assim o povo foi proibido de trazer mais.

O apelo aqui foi ao contrário: Não tragam mais ofertas. (Lembre-se de que esse povo ainda nem havia entrado na terra prometida e tinha acabado de sair da escravidão do Egito).

Ah, meu irmão, diante de coisa assim, você pode e deve pular, dançar e gritar glória e aleluia!

O segundo está no Novo Testamento [Atos 2, II Coríntios 8]. Vou transcrever os textos:
Em cada alma havia temor; ... Vendiam as suas propriedades e bens, distribuindo o produto entre todos, à medida que alguém tinha necessidade.

Também, irmãos, vos fazemos conhecer a graça de Deus, concedida às igrejas da Macedônia; porque no meio de muita prova de tribulação, manifestaram abundância de alegria, e a profunda pobreza deles superabundou em grande riqueza da sua generosidade. Porque eles, testemunho eu, na medida de suas posses e mesmo acima delas, se mostraram voluntários, pedindo-nos, com muitos rogos, a graça de participarem da assistência aos santos. E não somente fizeram como nós esperávamos, mas deram-se a si mesmos primeiro ao Senhor, depois a nós, pela vontade de Deus. (Confesso que me arrepio todo, diante desse texto).

Pode dançar, pular e gritar glória e aleluia, novamente!

Viu, ali em cima, a frase: em cada alma havia temor? Não era o temor das maldições de Malaquias 3; nem o temor de ver o seu nome em branco ou assinalado de vermelho no quadro à entrada do templo; nem o temor de não ser convidado a subir na plataforma, no domingo à noite, para receber as honrarias de dizimista fiel; ou o de não participar do banquete de entrega do título de nobreza. Era o temor do Senhor. Era o Espírito Santo no coração.

Lembra-se de Zaqueu? Sim, aquele publicano rico e baixinho, que trepou numa árvore para ver o Senhor Jesus passar. Quando o Senhor Jesus entrou em sua casa e no seu coração, sabe o que ele fez? Tomou uma decisão séria, que envolvia distribuição e restituição. Levantou-se no meio do banquete e disse: Senhor, resolvo dar aos pobres a metade dos meus bens; e, se nalguma cousa tenho defraudado alguém, restituo quatro vezes mais [Lucas 19]. Ninguém havia falado em dinheiro com ele; ninguém lhe tinha feito nenhuma promessa ou ameaça. Era somente o efeito do autêntico evangelho na sua vida, convertendo-o, levando-o ao arrependimento e à caridade. Naquela hora ele estava começando a ajuntar tesouros no céu, aonde não chega o ladrão, nem traça nem ferrugem corrói [Mateus 6, 19; Lucas 12].

O exemplo dos irmãos macedônios transcrito acima, de II Coríntios 8, é de tanger a alma e fazer a gente chorar de emoção. O apóstolo Paulo tinha sido encarregado de fazer uma coleta de ofertas para socorrer os santos em Jerusalém (não os santos de barro, pois esses não precisam de nada, mas os cristãos necessitados!), que estavam passando por privações. Ele achou que os cristãos macedônios não tinham condições financeiras de ajudar. Enganou-se, como você viu pela leitura acima. Agora, Paulo os tomou como exemplo para as outras igrejas. Curioso, não? O veemente apelo não foi feito pelo pregador, mas pelos contribuintes: Deixe-nos participar. Somos pobres, é verdade, mas nós também queremos contribuir e ajudar nossos irmãos!

Provavelmente, vai-se ouvir ainda algum pregador citar Malaquias 3. E quando ele o fizer, espero que não se esqueça de citar também o apelo feito por ele no capítulo 4: Lembrai-vos da lei de Moisés, meu servo, a qual lhe prescrevi em Horebe para todo o Israel, a saber estatutos e juízos.

Talvez, em matéria de finanças, o Exército de Salvação tenha alguma coisa a nos ensinar também. Administra tão bem o que recebe que foi considerado a mais eficaz das organizações. Deve ser por isso, que há poucos anos, Joan Kroc, viúva de Ray Kroc, fundador do McDonald’s, doou-lhe oitenta milhões de dólares. E mais recentemente, um pouquinho mais: um bilhão e meio de dólares!

Você sabe de onde provinham os recursos para o sustento de Jesus e seus doze apóstolos? Há pouca informação sobre isso. Sabemos, porém, que ele e os apóstolos não tinham mais tempo para trabalhar e prover o seu sustento. Eles haviam deixado suas atividades profissionais e andavam de cidade em cidade, de aldeia em aldeia, e se ocupavam em atender muitas pessoas. Às vezes, não tinham tempo nem para comer [Marcos 6]. O Senhor Jesus já não podia cuidar da carpintaria. Pedro, André, Tiago e João abandonaram a pesca [Mateus 4]. Mateus deixara a coletoria [Mateus 9]. Judas era o tesoureiro [João 12, 13]. E nada sabemos dos demais. Pois bem, quem nos dá notícia de como foram sustentados é Lucas 8. Algumas mulheres, que haviam sido curadas de espíritos malignos e de enfermidades, também os seguiam e davam-lhes assistência com os seus bens. Dentre elas, Maria Madalena; Joana, mulher de Cuza, procurador de Herodes; Suzana e muitas outras que ficaram no anonimato. Certamente era o sentimento de gratidão que as movia a fazer isso, e não Malaquias! Elas foram abençoadas: receberam a libertação e a cura, e agora retribuíam com os seus bens.

A síndrome da Maluquice

Não confundir com a síndrome de Malaquias. As duas costumam andar juntas, mas são diferentes. Uma quer arrancar o seu dinheiro pela opressão, pela ameaça de maldição, e com um versículo bíblico bem escolhido. A outra, pelo engano, pelo fetiche. Coisa deste tipo: o pregador arranja um objeto, como um manto, uma rosa, um troninho dourado, ou um pouquinho de terra, que ele diz ter trazido do monte Sinai, água do rio Jordão, ou sal grosso, e diz que se você tocar neles, vai ser abençoado, os seus negócios vão prosperar e você vai ficar rico — e nem cuida de alertar a você de que onde estiver o seu tesouro, aí estará também o seu coração! E, logo em seguida, chama algumas pessoas para dar o seu testemunho confirmatório do poder desses toques. Ou, então, você é orientado a fazer o desenho de uma chave de porta, e ele vai orar sobre ela, e dentro de alguns dias você vai ganhar ou poder comprar um apartamento ou uma casa. Com isso, diante do apelo dele, você lhe dá até o último centavo que tiver no bolso. E até o vale-transporte ou o dinheiro da passagem do ônibus você lhe entrega, e volta a pé para casa. Ou, se não tiver em espécie, você dá um cheque, ou até um cheque pré, ou passa o seu cartão de crédito na maquininha!

Outro inventa uma cerimônia, que inclui gestos e o próprio dinheiro. Ele manda fazer um baú — não o da felicidade! —, pega dinheiro de diversos países, mostra ao povo e diz: Este é o marco da Alemanha, venha para cá, e o coloca no baú, enquanto o povo vai fazendo um gesto com a mão puxando o dinheiro desse país para dentro do baú. Este é o dólar americano, esta é a coroa da Dinamarca, este é o dólar canadense, e assim por diante, e depois enterra o tal baú no piso da igreja. Isso terá o poder de atrair o dinheiro de diversas partes do mundo para aquela igreja, ele garantiu. E isso tudo em nome do Senhor Jesus, com a bênção do apóstolo, dos bispos e dos pastores. É uma coisa meio mágica — para não dizer, muito trágica!

Eu disse maluquice? Enganei-me: deve ser mandinga!

Diante disso, Mamon fica muito feliz e aumenta a arrecadação daquela igreja e o gazofilácio se enche. E com esse dinheiro no bolso, o pregador pode sair por aí pregando a prosperidade e dizendo aos crentes: Vejam irmãos, como Deus está me abençoando; ali fora está a prova, o carro zero quilômetro que ele me deu! E você vai lá fora conferir e, de fato, bem ao lado do seu fusca 68 está a reluzente BMW dele! Aleluia! Oh, glória! Ele grita... e você fica triste e frustrado! Não se preocupe. Não foi propriamente uma bênção de Deus. Foi com o dinheiro que ele arrecadou dos irmãos, de maneira apelativa e até com ameaça de maldições, que ele comprou aquele carrão.

Enquête incomodante

Veja o que eu aprontei, recentemente, com alguns amigos. Perguntava a um e a outro: O que aconteceria com a sua igreja se, de repente, todos os membros e congregados deixassem de contribuir financeiramente? Resposta unânime: Encerraria as suas atividades e fecharia as portas. Muito bem, esqueça isso, vamos a outra pergunta: O que aconteceria com a sua igreja se, de repente, o Espírito Santo, entristecido, se apagasse e não atuasse mais na igreja? Resposta unânime: A igreja continuaria funcionando normalmente. Certíssimo: os clubes e as demais entidades funcionam maravilhosamente bem, sem o poder do Espírito Santo, só com o poder do dinheiro! Então tome cuidado. Quem sabe você está freqüentando um clube e pensando que é uma igreja? Qual a mensagem central dessa igreja? É a mensagem primeira de João Batista, do Senhor Jesus e de Pedro: Arrependimento [Mateus 3, 4; Atos 2, 3], ou é aquela que visando à arrecadação de dinheiro ameaça, acusa e amaldiçoa?

Sei que o dinheiro não é tudo, mas não o subestimo. Eu estou ciente de que ele é bom e necessário. Mas não podemos esquecer da advertência paulina: O amor do dinheiro é raiz de todos os males. E os pastores e os crentes, mais do que ninguém, têm de saber administrar isso. Não podemos deixar Mamon — essa entidade maligna — nos dominar. Há igrejas por aí que mais parecem agências arrecadadoras de dinheiro. Até parece que a finalidade delas é angariar dinheiro. E para isso usam todos os recursos possíveis e impossíveis. E aqui, cabem algumas perguntas: Será que igrejas e/ou pastores precisam de time de futebol? Quadra de esporte? Banco (instituição financeira)? Serviço de segurança armada no templo? Carro blindado? Segurança particular?

A propósito disso, vou lhe contar um episódio. Certo pastor — dissidente, como centenas que há por aí; pois dissidência e divisões se tornaram moda no meio evangélico — me convidou para ir ao culto na sua igreja, pois havia um poderoso pregador (discípulo de outro mais poderoso ainda) que fazia milagre. E era milagre milagroso mesmo! Ele orava e os anjos vinham e trocavam o órgão da pessoa que estivesse doente: coração, fígado, rins etc. Era uma nova unção, chamada Cirurgia Divina. Fomos, minha esposa e eu. Naquele dia, ele ia somente ministrar curas. Chamou as pessoas doentes à frente. Quase todos compareceram. Isso porque se você reunir dez mil pessoas e perguntar quem sofre de algum mal, quase todo mundo vai levantar a mão! Fui conferir. O pregador perguntava à pessoa de que doença ela sofria, e ordenava que ela fechasse os olhos e ficasse em pé e bem relaxada. Ele ia orar e ela seria anestesiada pelo anjo. Atrás, havia um “apanhador” para segurá-la. E depois de tocada (ou empurrada?) pelo pregador, a pessoa ia para o chão. Chamou-me a atenção o timbre da voz do taumaturgo: era arrastada e cavernosa, como se estivesse sendo distorcida pelo controlador do som. Cai um aqui, cai outro ali, e dentro em pouco estava quase todo mundo estirado no chão. E os anjos começaram a operar sob o comando dele. Ele disse que uma senhora estava sendo tocada pelo anjo e já estava com as mãos frias. Fui verificar. Estava mesmo (com as mãos frias!). A garota do lado se virou, porque o anjo ia operar a sua coluna. Aquele outro tinha problema de hérnia. Mais um, com problema na vista. E os anjos cirurgiões iam operando. Esses anjos foram instruídos a deixar marcas, cicatrizes, como prova de sua intervenção. Terminada a tarefa dos anjos, o taumaturgo despertava os pacientes contando até três e estalando os dedos, naquele gesto típico do hipnotizador. Em seguida, o pastor local chamou o doutor fulano de tal, médico especialista em não sei mais em quê, e pediu que ele fosse com os homens a um local reservado, para verificar se os anjos tinham deixado evidências. As mulheres foram levadas para outro lado. Fiz sinal ao pastor e pedi permissão para acompanhar o doutor. Autorizado, acompanhei o doutor e logo perguntei o seu nome, e ele, mais que depressa, me disse que não era médico, era enfermeiro! Examinamos os pacientes, mas não vimos nenhum sinal, nenhuma cicatriz; e os pacientes, por sua vez, também não tinham sido curados e nada sentiram de diferente.

No dia seguinte, voltei com meu genro. Quando chamados, vieram os doentes para serem curados. Eram praticamente as mesmas pessoas da noite anterior. Fiquei de olho! E lá foram elas para o chão. Nessa noite, tive como observar e constatei que o taumaturgo colocava a mão na testa da pessoa e a empurrava, enquanto o acólito a amparava. Tudo como dantes, no quartel de Abrantes! Desculpe, não foi bem assim. Houve um detalhe curioso. Na hora de despertar os últimos pacientes, o milagreiro fez uma pausa e se voltou para os presentes e disse: Quero mostrar como os anjos respeitam os nossos votos. Então, chamou os que tinham o envelope já com a oferta para irem até o paciente deitado no chão e tocar com o envelope na cabeça dele, que de imediato o anjo o liberaria. Mas nesse momento, o próprio taumaturgo contava até três e estalava os dedos, repetindo o mesmo gesto da noite anterior. Na hora da perícia, nem precisei pedir permissão para acompanhar o anunciado doutor; o pastor me escalou também. Lá fomos nós. E nada de sinal, cicatriz ou qualquer evidência, ou cura.

Depois que voltei dos exames, vi que o pastor local começou a dar glórias e aleluias em voz alta. Uma mulher tinha sofrido uma cirurgia de varizes, e o anjo cirurgião havia deixado cicatriz, ele disse eufórico. Fomos conferir: meu genro e eu. Enquanto nós examinávamos a perna da paciente, o taumaturgo disse ao microfone: Examina aí doutor! Naquele instante, o auditório ficou sabendo que havia ali mais um doutor! Mas eu não sou médico. Costumo dizer que sou apenas doutor de papel: sou advogado. E, agora, nem isso. Pois estou com setenta e um anos e me aposentei; e já estou com o prazo de validade vencido, porque de acordo com o IBGE, a vida média do homem brasileiro é de 71 anos! E como disse o velho Moisés, estou na idade da canseira e enfado [Salmo 90]. Examinando cuidadosamente, constatamos que o sinal existente na perna da mulher era somente um sulco feito pela costura das calças que ela usava, à semelhança do que suas meias sapatilhas tinham deixado nos seus tornozelos. Ela tinha permanecido muito tempo deitada com uma perna sobre a outra!

Na noite seguinte, não pude voltar para ver mais milagres. Mas na semana seguinte, encontrei o pastor local, e comentei com ele o fato, dizendo-lhe que, na primeira noite, eu tinha ficado com a impressão de que o pregador era um picareta. Mas que, na segunda noite, fiquei com a certeza de que ele era vigarista! Então exortei o pastor conivente a não fazer esse tipo de coisa, ao que ele me disse: Mas doutor, eu precisava de levantar dinheiro para pagar o aluguel! Descobri que este era vigarista também! Mas não adiantou. Dentro de poucos dias ele fechou a igrejinha.

Para você que ainda não conhece, vou contar, em rápidas palavras, uma vigarice internacional.

Tive informação a respeito de uma mulher uberabense, que estava fazendo prodígios e sucesso nos Estados Unidos e em algumas cidades da Europa. O Senhor manifestava e os anjos punham ouro em pó na cabeça dela, de onde ela tirava e distribuía com os pastores e os irmãos. Cinco meses depois, tive notícias de que ela estava no Brasil. Um amigo a convidou para dar seu testemunho em Brasília, e ficou acertado que ela ficaria hospedada na minha modesta casa. Veio para ficar de terça a sábado, mas voltou na quarta-feira de manhã para a sua casa, em Uberlândia, onde passara a residir. Apesar do laudo que atestava que aquilo era ouro puro, o qual — afirmara ela — tinha sido fornecido por um dos maiores laboratórios de geologia de Washington, o seu ouro não passava de glitter, ou seja, pedacinhos de poliéster (plástico) dourado, que não resistiram ao calor de um palito de fósforo. Mas atrás dela, já tinham caminhado (quase de quatro) um bom grupo de crentes, pastores, bispos e apóstolo.

Cinco meses depois, por telefone e por intermédio de um intérprete, consegui falar com o autor do laudo: Daniel Roberts. Era apenas um modesto joalheiro da Virgínia, USA. Ele tinha examinado o ouro em pó somente olhando-o no microscópio. Ateou-lhe fogo, e o ouro se consumiu, e mesmo assim teve o desplante de afirmar que era ouro 24 quilates!

Ela se mudou (ou se mandou) para os Estados Unidos, onde continua fazendo grande sucesso. Se quiser mais informações sobre ela, busque na Internet. Pesquisando no Google “venefredo barbosa vilar”, você vai achar um artigo que escrevi sobre o episódio. Foi traduzido para o inglês e para o francês.

Esse tipo de coisa atrai muita gente, e onde há muita gente há muitos tostões... e de grão em grão a galinha enche o papo e o pregador enche a burra!

No ano passado, num programa de TV, vi um procedimento que não envolvia explicitamente o dinheiro, mas ia criar todas as condições favoráveis para um bom faturamento: reunir muita gente, mistificar, mexer com as suas emoções e extrair a grana.

Foi assim. O pastor mostrou umas taças, nas quais, segundo informou, havia as especiarias para a elaboração do Óleo ou Azeite da Santa Unção. Numa taça maior seria feita a mistura. Ele ia preparar o óleo, e as pessoas deveriam ir à igreja para serem ungidas e abençoadas. E, então, para legitimar a sua atitude e convencer seus telespectadores, leu alguns versículos em Êxodo 30. Estranhei tal coisa, e raciocinei: Se é correto preparar esse óleo, em nossos dias, para ungir as pessoas, então deve ser legítimo também construir um tabernáculo, um altar, uma bacia de bronze, fazer o incenso, pois tudo isso está ordenado no mesmo pacote. Veja a habilidade do tal pastor. Ele leu do verso 23 ao 25 e pulou para o verso 29. (Dei-me conta agora de que quebrei a minha promessa de não citar os versículos! Desta vez, passa). Então, a leitura fez sentido. Ficou assim:

Disse mais o Senhor a Moisés. Tu, pois, toma das mais excelentes especiarias, de mirra fluida quinhentos siclos, de cinamomo odoroso a metade, a saber, duzentos e cinqüenta siclos, e de cálamo aromático duzentos e cinqüenta siclos, e de cássia quinhentos siclos, segundo o siclo do santuário, e de azeite de oliveira um him. Disto farás o óleo sagrado para a unção, o perfume composto segundo a arte do perfumista: este será o óleo sagrado da unção. Assim consagrarás estas coisas, para que sejam santíssimas; tudo o que tocar nelas será santo.

Desconfiado da sua homilética, fui conferir na Bíblia e li os versículos que ele havia pulado:

Também ungirás a Arão e a seus filhos, e os consagrarás para que me oficiem como sacerdotes. Não se ungirá com ele o corpo do homem que não seja sacerdote, nem fareis outro semelhante, da mesma composição: é santo, e será santo para vós outros. Qualquer que compuser óleo igual a este, ou dele puser sobre um estranho, será eliminado do seu povo.

Movido de ira quase santa, fui à Internet e enviei um e-mail para a sua igreja, comentando o ato sacrílego desse pastor, e indagando se ele seria picareta ou vigarista, pois proposital e jeitosamente pulara os versículos que o proibiam de fazer tal coisa, e montara um texto favorável ao seu intento!
Ainda não recebi nenhuma resposta. Estou aguardando.

Até quando essa caterva de pregadores vai enganar o povo?

Espero que não inventem daqui a pouco fazer vestes especiais para os pregadores, no modelo das de Arão e de seus filhos [Êxodo 28]; porque alguns já usurparam a bênção sacerdotal privativa deles [Números 6, I Crônicas 23]:

Fala a Arão e a seus filhos, dizendo: Assim abençoareis os filhos de Israel; dir-lhes-eis:

O Senhor te abençoe e te guarde; o Senhor faça resplandecer o seu rosto sobre ti, e tenha misericórdia de ti; o Senhor sobre ti levante o seu rosto, e te dê a paz.

Assim porão o meu nome sobre os filhos de Israel, e eu os abençoarei.

E muito menos inventem fazer trombetas de prata e serpente de bronze, como foi ordenado também a Moisés fazer [Números 10, 21]! Senão, daqui a pouco a Graça já não será mais Graça, a Nova Aliança será anulada, e voltaremos à Lei, à Velha Aliança, celebrada com os judeus, esse escrito de dívida já cancelado, removido e encravado na cruz [Colossenses 2].